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Cidades

Servidores denunciam pagamento ilegal de licença-prêmio a juízes

O benefício foi suspenso para funcionários, mas paga sem lastro legal a magistrados; tribunal nega irregularidade

Humberto Marques | 18/10/2019 07:34
Servidores afirmam que Loman não prevê licença-prêmio para magistrados; TJMS aponta paridade constitucional com o MP para manter benefício. (Foto: Arquivo)
Servidores afirmam que Loman não prevê licença-prêmio para magistrados; TJMS aponta paridade constitucional com o MP para manter benefício. (Foto: Arquivo)

Denúncia sobre a concessão ilegal de licença-prêmio a magistrados do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) e sobre a suspensão do benefício para servidores do judiciário chegou ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça), PGR (Procuradoria-Geral da República) e STJ (Superior Tribunal de Justiça). A ação pede que sejam devolvidos mais de R$ 50 milhões aos cofres públicos.

A denúncia foi apresentada ao corregedor nacional de Justiça, Humberto Martins, que na próxima semana estará em Mato Grosso do Sul para cumprir o roteiro de inspeções do órgão. Uma segunda reclamação sobre o mesmo tema acabou anexada ao pedido, tendo assinaturas dos servidores Joel de Carvalho Moreira, Jorge Luiz Augusto Pereira e Dionizio Gomes Avalhaes (este aposentado). Todos já foram diretores do Sindijus-MS (o sindicato dos servidores do Judiciário Estadual).

O reclame parte, primeiramente, da alegação de que a Loman (Lei Orgânica da Magistratura) não prevê a licença-prêmio para magistrados. Ainda assim, o Judiciário estadual o instituiu em duas ocasiões, tendo como argumento decisões do próprio CNJ e do STF (Supremo Tribunal Federal) –citado por defesa e acusação em seus argumentos para manter ou cortar a vantagem.

Primeiro, a resolução 230/1994, havia previsto a benesse de três meses a cada cinco anos de assiduidade aos magistrados, com previsão de conversão em indenização na qual cônjuges e herdeiros poderiam a requerer a pecúnia em caso de falecimento do titular, de forma retroativa a 1979, ano da instalação do Estado. O dispositivo acabou revogado pela resolução 236, de 1995.

Depois, conforme a denúncia, por meio da lei 4.553/2014, que alterou o Código de Organização e Divisão Judiciária do Estado, foi incluído artigo prevendo aplicar aos magistrados do Estado dispositivos que instituíram a licença-prêmio nos moldes da existente para membros do MPF (Ministério Público Federal) e MPE (Ministério Público Estadual). Esta ainda estaria em vigor, mesmo com a previsão de deveria ser regulamentada pelo Conselho Superior da Magistratura, que não teria publicado dispositivo com tal fim.

Além de contrariar a Loman, a denúncia frisa que o STF (Superior Tribunal de Justiça) já se posicionara contra o pagamento de licença-prêmio aos magistrados; havendo um “vício formal e material” no pagamento por meio de lei estadual. Em outro ponto, foi contestado o pagamento do benefício a um juiz auxiliar do TJ sem que tivesse sido publicado no portal da transparência do órgão.

Caso será analisado pelo corregedor nacional de Justiça, Humberto Marques. (Foto: Agência CNJ/Arquivo)
Caso será analisado pelo corregedor nacional de Justiça, Humberto Marques. (Foto: Agência CNJ/Arquivo)

Sem recursos – A reclamação ao CNJ ainda cita dois atos deste ano do TJMS envolvendo pagamentos de licenças-prêmios no órgão. O primeiro deles, de 7 de maio deste ano, alterou lei estadual prevendo que o Funjecc (Fundo Especial para Instalação, Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, compostos por valores de custas judiciais) possa ser usado para bancar auxílio-alimentação, assistência médico-social e verbas indenizatórias não adimplidas, o que, em tese, permitiria o benefício contestado.

Na sequência, a reclamação afirma que, em 10 de julho de 2019, a presidência do TJMS suspendeu a licença-prêmio de servidores não-magistrados alegando falta de recursos financeiros. Em 29 de agosto, o benefício para funcionários que venceram em julho não foram depositados –sendo autorizado, porém, o gozo do período de folga se houver anuência do superior.

A reclamação ao CNJ pede a devolução dos recursos pagos como licença-prêmio a magistrados e o afastamento do presidente do TJMS, Paschoal Carmello Leandro, além de “inspeção urgente” no TJMS em forma de auditoria contábil no Funjecc. A reclamação também foi encaminhada à PGR, com denúncia por improbidade administrativa, e ao STJ.

Outro lado – O Campo Grande News contatou o TJMS para obter um posicionamento sobre os pagamentos realizados e suspensos, mas não obteve resposta até a veiculação desta matéria. Em resposta ao CNJ, o Judiciário estadual apontou, primeiro, que a denúncia “é mais uma investida do Sindijus e dos servidores”, contra a gestão da Corte. Pagamentos feitos a magistrados já teriam sido alvos de pedidos de esclarecimentos de Joel –que, em resposta, negou o caráter personalista de sua queixa–, enquanto, aos demais queixosos, foi atribuída insatisfação com “medidas de austeridade financeira” tomadas pela atual presidência, que incluem redução de servidores comissionados e revisão de contratos.

Ainda ao conselho, o TJ confirmou que suspendeu a conversão de licença-prêmio dos servidores em pecúnia virtude da falta de recursos, mas a deferiu em relação a inativos e previu a possibilidade de afastamento. A decisão foi baseada no fato de que, de 2019 a 2021, 3,5 mil servidores poderiam exercer o benefício, ao custo de R$ 83,7 milhões, “totalmente incompatível com a atual realidade do Judiciário”, que tem a pagar débitos de R$ 10,7 milhões e de R$ 6,3 milhões por retroativos a inativos.

Quanto a licença-prêmio dos magistrados, o TJMS argumentou haver previsão em lei estadual para seu pagamento, e sustentou a paridade de direitos com membros do Ministério Público, prevista na Constituição Federal, já reconhecida pelo CNJ e também do STF em relação a extensão de vantagens.

“Também importante dizer que o pagamento da licença prêmio aos membros da magistratura de Mato Grosso do Sul é informado mensalmente ao Conselho Nacional de Justiça há mais de três anos, não havendo nenhuma irregularidade constatada por esse Conselho”, prossegue o tribunal, em suas alegações, frisando que em 2018, na inspeção anterior à Corte, a Corregedoria Nacional de Justiça “nada constatou de irregular quanto a esse pagamento”.

Já a respeito da falta de publicação de provimento de 2015 regulamentando a benesse, o TJ informou não ter ciência de irregularidades, que o ato foi aprovado em sessão extraordinária do Conselho Superior da Magistratura e, notificado pelo CNJ, publicou o dispositivo, corrigindo e revogando o anterior, em 1º de outubro deste ano.

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