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Cidades

Aumentam crimes sexuais cometidos por adolescentes, constata promotor

Danúbia Burema | 07/02/2011 16:55

Estupro e abusos têm sido constantes na rotina de infratores

Adolescente de 15 anos (de camiseta laranjada) que se entregou após estuprar mulher no dia 23 de dezembro, durante roubo a uma chácara na Capital. (Foto: João Humberto)
Adolescente de 15 anos (de camiseta laranjada) que se entregou após estuprar mulher no dia 23 de dezembro, durante roubo a uma chácara na Capital. (Foto: João Humberto)

A impunidade tem motivado adolescentes a cometerem violência sexual associada a outros crimes, como a invasão a residências. Na avaliação de quem cuida dos processos, a grande quantidade de registros de delitos consorciados com o estupro ocorre porque o adolescente prefere "não perder a viagem", já que sabe que sua pena será praticamente a mesma caso seja pego.

“Só hoje tenho na minha mesa oito procedimentos envolvendo violência sexual cometida por adolescente”, exemplifica o promotor de Justiça Sérgio Harfouche.

Na vara da Infância e Juventude, são incontáveis os casos que chegam diariamente tendo garotos como autores de abusos e vários deles chamam a atenção pela barbárie.

Entre os fatores apontados pelo promotor como causadores desse comportamento nos adolescentes, dois se destacam: a questão biológica, pois nessa idade eles estão com os hormônios a flor da pele, e a certeza de que não permanecerão muito tempo presos.

Segundo Harfouche, vários garotos têm um pico de violência antes da maioridade, na tentativa de cometer a maior quantidade de infrações possíveis antes de serem imputáveis. “Se estiver perto de completar 18 anos, o adolescente sabe que não ficará mais de seis meses na Unei e por isso aproveita para cometer uma série de crimes”, explica.

O promotor avalia que o sistema falido de reeducação também contribui, mas não é problema apenas em MS e sim em todo o País. Um dos adolescentes com processo em trâmite na Promotoria acabou de completar 18 anos, mas já acumula extensa ficha criminal que ocupa três páginas.

“Os adolescentes que não se permitem reeducar estão aproveitando a lei para se tornar delinquentes”, observa Sérgio Harfouche. Para ele, outras questões influenciam o comportamento dos garotos, como a falta de instrução adequada. “Como você vai reeducar se não consegue nem educar?”, questiona.

Hediondos - Casos ocorridos recentemente mostram a barbárie de que adolescentes são capazes. Na noite do dia 23 de dezembro, um garoto de 15 anos ajudou um homem de 30 anos a render sete pessoas em uma chácara na região das Três Barras, na Capital.

Três homens e duas crianças foram encapuzados e amarrados no banheiro da chácara, enquanto o adolescente e Wanderlei Rocha da Luz, de 30 anos, abusavam sexualmente de duas mulheres, uma delas gestante de oito meses, que chegou a implorar para não ser estuprada temendo pela vida do bebê.

Depois de render a família, o garoto e Wanderlei mandaram a grávida e uma amiga dela ficarem nuas. Por três horas o menino estuprou uma das vítimas enquanto o comparsa obrigava a gestante a praticar sexo oral nele. O homem foi preso dois dias depois e o garoto de 15 anos se entregou à Polícia no dia 3 de janeiro.

Em 11 de novembro do ano passado, dois adolescentes também de 15 anos foram apreendidos suspeitos de estuprarem uma criança de apenas sete anos dentro de uma escola de Corumbá. Como não foram pegos em flagrante, eles tiveram que ser liberados. Os pais apenas assinaram termo de compromisso de que os apresentarão quando for solicitado pela Justiça.

No dia 31 de agosto, outro garoto foi apreendido na aldeia Amambai acusado de estuprar a própria irmã de 4 anos, que ficou bastante ferida após a violência sexual.

Processo em trâmite na Promotoria relata o caso de um adolescente de 15 anos que rendeu uma família, em crime cometido no ano passado, e obrigou a mulher a manter relação sexual com ele na frente dos filhos de três e cinco anos.

Enquanto um comparsa agredia o pai das crianças, que ficou desacordado no banheiro, o garoto cometia a violência sexual. Conforme o processo, ele ameaçou abusar das crianças se a mulher dificultasse a relação e apenas por isso ela concordou. Quando um policial encontrou as vítimas, a mulher estava seminua com as crianças no colo escondidas em um matagal perto da casa.

No dia 5 de outubro do ano passado, uma quadrilha invadiu uma casa na Vila Morumbi e rendeu um homem de 35 anos e a mulher dele, de 32 anos. Rodrigo de Mendonça Rosa, que havia completado 18 anos, aproveitou o crime para estuprar a mulher em um matagal onde as vítimas foram deixadas.

Enquanto isso, seus comparsas levavam a F-250 pertencente ao casal. Reconhecido como estuprador, Rodrigo foi preso pelo Garras em cumprimento a um mandado de apreensão por outro crime, cometido quando era adolescente, e encaminhado a uma Unei.

Os crimes sexuais não se limitam aqueles cometidos contra a sociedade. Outro processo na promotoria da Infância e Juventude tem como autores cinco adolescentes, que estupraram outro dentro de uma Unei. Informações sobre o processo são sigilosas.

Dentro de casa, também há agressões sexuais cometidas por adolescentes. No dia 8 de maio de 2009, um garoto de 15 anos aproveitou que prima de dois anos estava na sua casa para abusar dela. Ele confessou que a menina foi até seu quarto e ele pediu que deitasse em sua cama. Sem que ninguém visse, ergueu o short da criança e esfregou o pênis em sua vagina. Conforme o promotor, o número de ocorrências desse tipo é grande e ainda há que se considerar a quantidade de casos em que a família não denuncia.

Recorrente - Com passagens policiais por tráfico, furto, receptação, entre outras, o rapaz que há pouco completou 18 anos e já possui extensa ficha criminal cometeu os crimes com 40 comparsas diferentes. Uma semana depois de ser internado neste ano, foi solto “contra a opinião do Ministério Público Estadual”.

O motivo é ter completado a maioridade, que lhe dá o presente de uma ficha criminal sem os antecedentes de crimes cometidos quando ainda era adolescente. “Apesar do Estatuto da Criança e do Adolescente prever cumprimento de medida até os 21 anos, a maioria deles sai quando completa 18 anos. Os adolescentes já contam com a impunidade”, diz o promotor.

Além da crueldade dos crimes, o que chama a atenção é o pouco tempo que permanecem presos. Dos internos da Unei Dom Bosco, por exemplo, a maioria foi internada no final do ano passado. Apenas três deram entrada em julho, agosto e setembro de 2010.

Permissividade – Para Harfouche, o comportamento demonstrado pelos adolescentes é em parte decorrente da permissividade da sociedade em relação a eles, para os quais “tudo é permitido”.

Além disso, observa, as crianças e jovens são constantemente bombardeadas por conteúdo erótico em propagandas e de maneira geral.

Harfouche afirma que os adolescentes se comportam de maneira semelhante às crianças ao testar os limites, contudo a sociedade não tem mostrado as regras a eles.

Para o promotor, o problema começa em casa quando pais pensam que não pode mais educar. Depois a escola é omissa por receio de se complicar. “Vivemos no meio de um marketing equivocado segundo o qual a família e a escola não têm direitos, mas isso não é verdade. Não é o que diz o Estatuto (da Criança e do Adolescente)”, defende.

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