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Capital

Após 8 anos, acidente com 2 mortes na Via Parque acaba sem punição

Aline dos Santos | 13/10/2016 11:23
Restos de veículos na Via Parque em acidente fatal na primeira hora de 9 de agosto de 2008. (Foto: Arquivo)
Restos de veículos na Via Parque em acidente fatal na primeira hora de 9 de agosto de 2008. (Foto: Arquivo)

Um acidente na madrugada, duas mortes, quase três mil dias e o desfecho por extinção de punibilidade do condutor. O cenário é a síntese de uma tragédia que começou à 1h30 de 9 de agosto de 2008, no cruzamento da Via Parque (Neli Martins) com a rua Santa Bárbara, bairro Giocondo Orsi, em Campo Grande. O acidente entre um Gol e um Pálio resultou na morte imediata de um adolescente de 15 anos e, logo depois, no hospital, de um rapaz de 19 anos.

As vítimas foram Kaique Gabriel Brito de Sena e Dener Cézar Nunes de Araújo. Eles e mais quatro pessoas ocupavam o Gol. No local do acidente, foi preso Anastácio da Silva Yarzon Ortiz, então com 18 anos e condutor do Pálio.

Com ingresso em 12 de agosto de 2008 na Justiça Estadual, o processo começou como homicídio com dolo eventual. Para o MPE (Ministério Público Estadual), uma sequencia de fatores caracterizaram o risco de as condutas de Anastácio resultarem em morte no trânsito: dirigia o veículo embriagado, em alta velocidade, sem habilitação e desobedecendo a sinalização de parada obrigatória.

O exame de alcoolemia do condutor do Pálio apontou 0,93 mg de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões, enquanto o permitido é 0,29 mg/l. Na fase de depoimento, 32 meses após o acidente e morando no interior de São Paulo, Anastácio disse que estava em reunião com amigos, onde tomou duas garrafas de cerveja e voltava para a casa. Ele ficou preso sete dias, entre 9 e 16 e agosto de 2008.

Após quatro anos, em 2012, o juiz determinou que o condutor fosse a júri popular, por meio de sentença de pronúncia. Nos anos subsequentes, houveram idas e vindas em diversas esferas do Judiciário.

Em 28 de janeiro de 2013, o TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) desclassificou a conduta para homicídio culposo na direção de veículo automotor. Desta forma, o processo foi transferido da Vara do Tribunal do Júri para Vara Criminal. Com a mudança, a pena é determinada por um magistrado e a pena é menor em comparação ao homicídio doloso, onde o réu também passa pelo crivo de sete jurados.

Kaique foi um dos mortos em acidente. (Foto: Arquivo)
Kaique foi um dos mortos em acidente. (Foto: Arquivo)

Após mais impasses, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) manteve em 2014 a decisão do Tribunal de Justiça. Em junho deste ano, o desfecho do processo foi a extinção da punibilidade ao réu Anastácio Ortiz.

Na decisão, o juiz da 1ª Vara Criminal, Roberto Ferreira Filho, informa que entre a data do recebimento da denúncia (07/05/2009) até os dias de hoje, decorreu prazo superior a sete anos e, tratando-se de réu menor de 21 anos à época dos fatos (o que enseja a redução do prazo prescricional pela metade) há de ser reconhecida a prescrição.

Foram prescritas as acusações de homicídio culposo na direção de veículo automotor, dirigir sem CNH e sob influência de álcool, além de praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor.

O juiz afirma que recebeu o processo praticamente prescrito. A decisão considerou que a pena máxima aplicável era de cinco anos e quatro meses, com prazo de prescrição de 12 anos. “E tem uma peculiaridade. Para pessoas com mais de 70 e menos de 21 anos, o prazo é pela metade. É preciso tomar cuidado na indicação do crime. Se tivesse corrido aqui desde o início, não teria prescrito”, salienta o magistrado. No caso citado, prescreveu em seis anos.

Tese aventureira – Do ponto de vista da defesa, o desfecho do processo, o primeiro sobre a Lei Seca no Estado, é resultado de uma tese aventureira do MPE, que buscou a classificação por dolo eventual.

“Desde o primeiro momento venho dizendo que ele só poderia ser acusado por homicídio culposo e o MPE insistindo no dolo eventual. Por causa dessa insistência, acabou o processo e a culpa é do Ministério Público, que insistiu nessa tese, nessa aventura jurídica. É justo um promotor, porque entende assim e fora de qualquer parâmetro, achar que cabe dolo eventual e insistir 10 anos nisso? ”, diz o advogado Carlos Magno Couto.

Ele aponta que o processo foi marcado pelo uso de quase todos os recursos possíveis no Código Penal. Nesses oito anos, a ação teve declaração de suspeição de magistrado após ficar seis anos no processo e reconsideração de ministros sobre decisões no STJ e STF (Supremo Tribunal Federal).

Para a defesa, Anastácio acabou condenado pela opinião pública. “Sofreu uma pena que vou te contar. Pensa num menino exemplar. Tirando a carteira de motorista, pega o carro, vai numa festinha. Chega na Via Parque, que era considerada a Via da Morte, sem placa de Pare. Era um menino diferente desses que tiram racha, beberrão. Foi um desses dramas da vida”, relata o advogado. De acordo com a defesa, o MPE apontou a prescrição.

Inconformado – Assistente de acusação, o advogado Elson Ferreira Gomes Filho afirma que recorreu da decisão no TJ/MS por meio de um recurso em sentido estrito. “Alegamos que não houve prescrição porque a sentença de pronúncia, que havia determinado a ida do Anastácio a júri, interrompeu a prescrição”, diz.

O tribunal ainda não se manifestou sobre o pedido. Segundo o advogado, a intenção é que o processo seja retomado e que o réu seja penalizado pelo crime culposo. Sobre o fato de o processo ter se arrastado por oito anos, Elson explica que a ação teve muitos recursos da defesa e foi para tribunais em Brasília.

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