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Capital

**Campo Grande News** entrevista Dom Dimas, um bispo de opinião

Aline dos Santos | 30/07/2011 11:22
Dom Dimas em entrevista ao Campo Grande News, após assumir Arquidiocese. (Foto: João Garrigó)
Dom Dimas em entrevista ao Campo Grande News, após assumir Arquidiocese. (Foto: João Garrigó)

A fala serena e os gestos comedidos contrastam com o vigor das idéias de Dom Dimas Lara Barbosa, novo arcebispo de Campo Grande. Aos 55 anos, o mineiro de Boa Esperança ainda se ambienta no novo local de trabalho.

Com tripla jornada, ele se divide entre a presidência da Comissão de Comunicação da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e a vice-presidência do Celam (Conselho Episcopal Latino-americano). Com tantas tarefas, está há poucos dias na Capital.

“Faz uma semana, uns dez dias, se muito. O tempo é relativamente pequeno para se ter uma visão completa”, relata sobre a nova missão.

Pela frente, há muitos planos - como a criação da Comissão de Justiça e Paz, além de algumas opiniões "[homossexualismo] não se trata de opção”, e de problemas crônicos, como a briga, muitas vezes regada a sangue, na disputa de terra entre índios e fazendeiros. “É complicado, uma situação espinhosa".

Formado em engenharia pelo ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), renomada faculdade brasileira, faz do pensar um oficio. “Tenho cabeça de engenheiro”.

O mesmo raciocínio lógico que o leva a se indagar sobre a utilidade de ter uma lareira, que se destaca no escritório da arquidiocese, em uma cidade quente como Campo Grande é aplicado em questões polêmicas.

Intransigente quando se trata da defesa a vida, como o repúdio ao aborto, ele lembra que é preciso equilibrar radicalismo e paixões em questões como criminalização da homofobia e união de pessoas do mesmo sexo.

Sem nenhum sacerdote na família, Dom Dimas confessa que demorou oito anos para atender ao chamado da vocação. “Parava em frente à empresa onde trabalhava e pensava. Seus colegas casaram, têm filhos”. Sobre ter feito a escolha certa, o sacerdote que teve rápida ascensão dentro da igreja católica, responde com humildade. “Espero não atrapalhar a obra de Deus”.

Estudioso, participava no Rio de Janeiro de um seleto grupo de debate, formado por imortais da Academia Brasileira de Letras, integrantes da academia brasileira de Medicina e Ciências, ex-ministros.

Considerado umas das cem personalidades mais influentes do país, Dom Dimas discorre com fluidez sobre filósofos e correntes de pensamentos, mas no dia da entrevista, era simplicidade da frase contida num cartaz, vista de relance durante visita num centro de convivência para idoso, que lhe roubara a atenção.

“No cartaz dizia: velho é quem perde a coragem de sonhar".

Gentil, ao fim de uma hora de entrevista, se despede cantarolando trecho da música francesa com o nome da repórter.

 **Campo Grande News** entrevista Dom Dimas, um bispo de opinião

Campo Grande News – Além de líder católico destacado, o senhor é também um intelectual respeitado. Com essas credenciais, que impressões e opiniões tem sobre o novo rebanho que lhe cabe pastorear e sobre Mato Grosso do Sul?

Na realidade, a visão global ainda é muito reduzida. Embora tenha assumido no último dia 10, no dia 12 viajei por conta do curso de comunicação para bispos, depois teve o mutirão de comunicação. De modo que posso dizer que estou aqui mesmo há questão de uma semana, dez dias, se muito. O tempo ainda foi relativamente pequeno para ter uma visão de conjunto. O que estou procurando fazer, isso sim, é ter contato com a igreja de Campo Grande. Procurado me reunir com todas as lideranças.

Através desses encontros quero ter uma visão de conjunto das pastorais e das atividades na arquidiocese. Já tive oportunidade conhecer nosso Instituto de Teologia. Terei um encontro no Instituto de Filosofia com toda equipe de animação vocacional. Isso é sempre prioritário. Não só a vocação do ministério sacerdotal.

Basta lembrar que os adolescentes, de maneira geral, quando estão terminado o Ensino Médio, não têm orientação que ajude a discernir sobre o próprio futuro. Hoje estamos num mercado muito competitivo, que obriga muitas vezes os jovens a entrarem no mundo do trabalho em área que não é a que efetivamente sonhara, para qual são os mais aptos.

Então, acho que o trabalho de orientação vocacional, quer seja para discernimento da própria profissão, seja para a vida matrimonial, para a vida religiosa, é importante.

Já sei que temos um trabalho muito importante na forania rural. Ainda pretendo visitar os assentamentos. Na nossa arquidiocese, se concentram cerca de 2% dos assentamentos de todo o Brasil. É uma quantidade bastante significativa. Por enquanto estou nessa fase de namoro com a própria realidade da igreja diocesana.

Campo Grande News – Quais os planos para o trabalho frente à diocese de Campo Grande?

Quero montar uma equipe de análise de conjuntura. A gente sempre teve essa prática na CNBB. Uma equipe de especialistas, não necessariamente católicos, de várias tendências. Entra sociólogos, antropólogos, militantes da política. Para que regularmente possamos estar nos reunindo.

Cada vez vamos abordar um tema. Por exemplo, ano que vem a Campanha da Fraternidade será sobre saúde publica. Como está a saúde publica no nosso Estado? Precisamos capacitar os agentes para que essa campanha possa produzir seus frutos.

Provavelmente, isso vai se dará no âmbito da comissão diocesana de Justiça e Paz. Acho muito importante termos uma. Porque existe a Comissão Brasileira Justiça e Paz, existe o pontifício Conselho de Justiça e Paz, que é em Roma. A comissão, normalmente tem estatuto próprio.

Não é só para pensar conjuntura, tem ações concretas, lugar de recebimento de eventuais denúncias, violação dos direitos humanos, conflito na área da cidadania em geral.

A comissão tem a tarefa de disseminar a doutrina da igreja, formar consciência política, formar na área da cidadania. Cito alguns exemplos concretos. Em Brasília, a comissão foi membro fundador do comitê de combate a corrupção eleitoral.

Em 1999, aprovou a Lei 9840, a primeira lei de iniciativa popular contar a corrupção e compra de votos. Agora, sem duvida, foi importante na lei da Ficha Limpa.

Campo Grande News – O senhor certamente sabe das graves questões indígenas. Problemas acumulados secularmente explodem em conflito por terra com fazendeiros, alcoolismo, num cenário de convulsão social. Como a igreja pretende agir em Mato Grosso do Sul?

O que acompanhei como secretário geral da CNBB, particularmente, é a situação que acontece na região de Dourados, Rio Brilhante. Onde visitei as tribos caiuá-guarani. Em Rio Brilhante, estavam acampados na beira da estrada, uma situação muito precária.

Inclusive, quando estive em Dourados pela primeira vez, tinham assassinado dois professores. O que eu pude perceber naquela região é que existia algo, que, infelizmente, acontece em outras regiões do país.

Por exemplo, no Oeste catarinense, em Chapecó, tem uma situação parecida. O próprio governo do Estado há muitos anos atrás, décadas, vendeu título de terra para pequenos proprietários, que fizeram ali a sua vida, constituíram família. Não são posseiros, são pessoas que pagaram.

O grande problema é que quem lhes venderam terra que não tinham direito de vender. E agora entra a problemática na justiça. Os verdadeiros donos, os povos indígenas, querem suas terras. Por outro lado, os fazendeiros de boa fé dizem: E a gente, com fica?

Sei muito bem como isso dói. Minha família foi atingida por barragem, em Minas. Fomos atingidos quando foi construída Furnas. Vi cidades inteiras sendo submergidas A nossa própria casa foi destruída.

Naquela época, tinha família que não conseguia comprar telhas para a casa nova com o valor da indenização, foi um problema social muito sério. O simples fato de ver sua cidade, seu cantinho, desaparecer é complicado.

Estamos diante de uma situação espinhosa. Em que é preciso cuidar para que aqueles proprietários tenham direito garantido; cuidar que os povos indígenas tenham seu direito igualmente garantido. A cultura dos povos indígenas tem enraizamento na terra muito grande. O que leva ao número bastante elevado de suicídios, alcoolismo.

Quando estava na secretaria geral da CNBB, lembrei a presidente Dilma que é preciso que o governo tenha mais agilidade em resolver essa problemática. Muitas vezes, a Funai e os outros organismos são muito lentos na demarcação de terra indígenas.

Para saber se é terra indígena ou não, exige dedicação, pessoas capacitadas, envolvimento e vontade política.

Se o Estado tiver parcela de responsabilidade, não necessariamente Mato Grosso do Sul, paciência. Se houve erro de administração passada, não interessa.

Campo Grande News - Mas o senhor vislumbra caminho para resolver esse grave problema?

A questão indígena é grave em Dourados. Vai ter que ter aproximação. Quem sofre muito na pele é Dom Redovino, bispo de Dourados. A partir de domingo terá uma nova diocese em Naviraí. Quem sabe com isso, a presença de dois bispos, do ponto de vista da ação da igreja, ganhe um novo dinamismo.

Já cheguei a propor ao Cimi (Conselho Indigenista Missionário) um debate público transmitido pela nossa tv. Fizemos isso quando a questão era a regulamentação fundiária na Amazônia.

Chamamos a CNBB, o ministro Mangabeira Unger, que era o idealizador do projeto, o Carlos Minc, ministro do Meio Ambiente. Era para vir a então ministra da Casa Civil, mas vieram só os dois ministros. Estiveram presentes representante da Funai, Incra, Ibama, foi transmitido em cadeia pela Rede Vida e outras TVs.

Foi um bom debate. Os próprios ministros não tinham compatibilidade de pensamentos. Diante da situação conflitiva, o debate é a melhor solução. Sem muitas paixões. Claro que sem paixão não tem como trabalhar, mas não precisa ser uma paixão tão desenfreada, tirando razões do adversário.

Que seja debate, não polêmica. Acho que a questão indígena mereceria debate nesses moldes. Quem sabe o debate aconteça aqui, uma boa oportunidade para levantar bandeiras.

Campo Grande News – O senhor destacou que a Igreja falará em defesa dos direitos humanos sempre que for necessário. O Brasil está avançando em relação ao respeito e promoção de suas minorias?

Em termos nacionais, temos tidos muitas conquistas nos direitos humanos. A comissão da anistia fez um trabalho significativo. Já teve sessão solene na própria CNBB, casos de religiosos que foram vitimas da tortura. A Secretaria da Igualdade Racial conseguiu emplacar seu estatuto. Tem o Estatuto do Idoso, da Criança e do Adolescente, a própria rede do consumidor. São projetos que trouxeram sim avanços.

Mas tem muita coisa para fazer. A Segurança Pública é precária no Brasil. Nosso sistema penal é um sistema burro, não é um sistema que ressocializa, recupera. Cadeia hoje é escola de bandidagem.

O sistema sócio-educativo para criança e adolescente em conflito com a lei, privado de liberdade, é o patinho feio de toda administração. É o que tenho visto em alguns Estados, não se aqui. Mas já denunciei no Rio de Janeiro várias vezes.

Começava na Casa Civil, passava pela esposa do governador, depois ia para a secretaria de Direitos Humanos, de Justiça. Numa única gestão de quatro anos passava por quatro, cinco secretarias. Não davam conta do recado, vejo como uma lacuna no próprio ECA.

As torturas existem nas prisões sim! O Brasil tortura e tortura muito os nossos presos. Não é segredo para ninguém que trabalha na Pastoral Carcerária. Estou falando a partir da realidade nacional, aquilo que vi no Rio de Janeiro, São Paulo e outras cidades.

O narcotráfico ainda desafia as nossas autoridades. Somos modelo no mundo inteiro na campanha de combate ao tabaco. Mas não temos modelo equivalente de combate à droga. Já não falo da questão policial, mas de conscientização mesmo.

Também tem o sistema de educação que e muito precário; a saúde pública, em muitos lugares é uma ficção. A PEC do trabalho escravo não emplaca de jeito nenhum. O tráfico de pessoas, exploração sexual de adolescentes. São chagas que temos ainda na nossa realidade e tudo isso faz parte das preocupações da igreja.

Isso não significa que não foram dados passos. Os programas sociais do governo federal produziram sim resultados positivos, o Bolsa Escola, Bolsa Família. Projetos que podem ser melhorados, sem dúvida, mas deram passo significativo no processo de distribuição de renda. O Brasil desponta como país emergente, temos credibilidade lá fora. Eu vi na viagem que fiz a Roma. Casas de câmbio que aceitam o Real na Europa.

"Existe hoje um problema não só da igreja católica, um problema cultural , efeito da globalização, que é o despertar da subjetividade de maneira muito exacerbada."
"Existe hoje um problema não só da igreja católica, um problema cultural , efeito da globalização, que é o despertar da subjetividade de maneira muito exacerbada."

Campo Grande News – Casamento gay, aborto. São temas que emergiram nos últimos tempos com grande repercussão social e política. Como o senhor vê essas questões e como imagina que a Igreja possa enfrentá-las a longo prazo?

Cada um desses temas merece análise em separado, tem peculiaridades e gravidades diferentes. Uma questão é o aborto, enquanto assassinato de um ser vivo. Não é a igreja que diz isso, não é um dogma de fé, mas é a boa ciência que mostra que tem realmente ali um programa genético definido.

Se der condições, ele vai crescer, nascer, amadurecer e morrer. Então, se é para defender os direitos humanos, o direito a vida é o primeiro deles. Isso não significa desconsiderar a gestante. Num grande hospital, encontrei uma grávida, la pelo sétimo, oitavo mês, segurando a barriga com uma mão, o soro na outra, andando e procurando quem pudesse atender.

O combate à legalização do aborto, não está de forma alguma esquecendo a dignidade da gestante, pelo contrário. O próprio governo está preocupado com o aumento muito grande da gravidez na adolescência. Não basta distribuir camisinhas na escola, porque não tem processo de educação ao respeito pelo outro. O outro não é só fonte de prazer, mas alguém que merece respeito.

Campo Grande News – Em Campo Grande, a possibilidade da instalação de máquinas dispensadoras de camisinhas em escolas gerou polêmica. Inclusive, com projeto na Câmara para vetar a distribuição do preservativo em ambiente escolar. O senhor é contra a instalação dessas máquinas em escolas?

Com a distribuição de camisinha na escola. Você esta dizendo institucionalmente para a galera jovem, libera geral, pode transar a vontade, só use camisinha. O problema é que sexo não é só a concepção ou a contracepção.

Uma relação sexual atinge o profundo da pessoa. Quando, sobretudo a menina, sente que foi usada por alguém que a enganou, mesmo que não tenha gerado gravidez, é algo que a machuca profundamente. Não que o rapaz está isento desse tipo de sentimento.

Sinto que é um tema sobre o qual não se fala com seriedade que ele merece. Vamos testar um programa, que não é da igreja, em uma escola de São Paulo a partir de agosto. A idéia e que o tema educação para valores passe a fazer parte da política pedagógica das escolas que quiserem aderir.

O atual papa, antes de eleito, as vésperas do conclave, usou uma expressão muito séria, a ditadura do relativismo. Se você tem valores, princípios firmes, dos quais você não abre mão, não precisa sair batendo nos que não concordam. A radicalidade dos princípios não significa comportamento violento ou desrespeitoso para com aqueles que pensam diferente.

É proibido proibir, colocar limites. Mas é preciso ter limites sim. A criança tem que aprender a limites. Estamos em crise educacional, que exige criatividade. Mas não vejo o futuro nem o presente sendo sombrio. Existe o despertar da consciência do voluntariado, que é muito bonito.

O que tem de jovens empreendedores, que saem colocando seu talento a serviço do bem comum. É interessante, tem muita gente que fala que a juventude é problema, sinal de rebeldia. Mas todo mundo quer ser jovem. Acho um erro dizer que o jovem é o futuro. É o aqui e agora.

Celebrei uma missa no centro de convivência do idoso da sagrada família e estava escrito: “Velho é quem perdeu a coragem de sonhar”. Você pode ser idoso e cheio de ideais e você pode ser um velho moço. Como já dizia Taiguara, antes de você nascer.

Campo Grande News – E quanto à união estável de pessoas do mesmo sexo, reconhecida neste ano pelo STF (Supremo Tribunal Federal)?

Homoafetividade ou homossexualismo, é um tema que precisa ser melhor conhecido, a própria ciência não conhece adequadamente o fenômeno. Não se trata de uma opção.

Não me parece, pela experiência que tenho em conversa com pessoas homossexuais, que elas fizeram uma escolha. Elas trazem consigo uma tendência, digamos, que as leva a ter atração pela pessoa do mesmo sexo. Mas não se sabe como isso acontece, quando começa um sexo biológico e um sexo psicológico.

É um tema sobre o qual precisa se conversar mais e tomar cuidado com certos radicalismos. Como a tal lei da homofobia, que estava no Senado. Era de uma radicalidade tão grande. Por exemplo, se um casal de namorados estiver de agarro na sala, chamo atenção e peço para sair. Mas se fossem homossexuais, poderia ser processado.

Se tenho um seminarista que mando embora porque ele não consegue viver a castidade, tem namoradas, não tem problema nenhum. Se mando embora porque não consegue viver a castidade por ser homossexual, poderia ser preso. Graças a Deus já houve avanços, o projeto que vai voltar para a Câmara tem outras formatação. Nenhum de nós quer mal a alguma pessoa pelo fato de ter tendências homo ou heterossexual. Todos têm direito ao meu respeito e à proteção do Estado.

Você pode ter financiamento público para mudança de sexo. Se houver uma pessoa homossexual que não está contente com a situação e quer mudar, ela não tem apoio nem tratamento, porque a OMS (Organização Mundial de Saúde) não considera doença. É um campo que precisaria ser menos tabu. Que não fosse logo taxado de homofóbico.

O conflito de direitos existe. Tenho direito à boa fama, você tem direito à informação. Confesso, por exemplo, que mesmo sendo pessoa pública, não gostava de ver a foto do presidente Lula de sunga quando estava de férias na praia. Pelo amor de Deus, é uma coisa particular, não pode tirar uns dias de férias. Acho de mau gosto danado usar um terço simulando órgão genital. O artista tem direito à criatividade, eu tenho direito ao respeito à minha fé.

Campo Grande News – O senhor aplica o conhecimento de engenheiro formado na mais renomada escola do país, o ITA, para a ação pastoral?

Na realidade, quando, aos 18 anos, fui para São Jose dos Campos fazer engenharia nunca pensei em ser padre. Era de família católica, fui coroinha sete anos, mas nunca pensei. Fui fazer o vestibular e estudar. A vocação surgiu no segundo ano da faculdade.

Um grupo de universitários se reunia para meditação, estudo da bíblia. A partir dai fui sentido Deus muito mais próximo do que estava acostumado. Decidir terminar o curso, se Deus tinha me permitido passar no vestibular, considerado um dos mais difíceis do país, alguma coisa Ele queria. Ainda demorei bons oito anos antes de decidir pelo seminário.

Trabalhei, fiz mestrado. Até que chegou o momento do ‘chega de fugir’, agora vamos encarar. Mas sobre a formação, você traz ela, não tem como. Tenho cabeça de engenheiro, não tem jeito. Isso me ajuda muito quando se trata do dialogo fé e ciência, fé e razão.

Eu tinha um grupo no Rio, pode até ter coisa parecida aqui. Tinha um grupo de 16 pessoas. Reuníamos de 15 em 15 dias, na paróquia Nossa Senhora da Paz em Ipanema. Tinha quatro membros da Academia Brasileira de Letras, quatro da Academia Brasileira de Medicina, um da Academia de Ciências. Tinha gente da Antropologia, Filosofia, Engenharia, um matemático de primeira linha, quatro ex-ministros. Discutíamos temas da atualidade.

Campo Grande News - Quando veio a decisão pelo sacerdócio?

Nesses oito anos, participei da igreja sem coragem de dar o passo definitivo, depois, cheguei à conclusão que era o caminho. Como seminarista, fazia um exercício intencional. Falava, olha você estava se preparando para ir para os Estados Unidos, pensa bem, ainda dá tempo. Seus colegas hoje são casados, têm filhos, você não quer isso.

Campo Grande News – Então, fez a escolha certa?

Espero, pelo menos, não atrapalhar a obra de Deus.

Dom Dimas a frente em dia de posse, seguido por Vitório Pavanello, ex-arcebispo.
Dom Dimas a frente em dia de posse, seguido por Vitório Pavanello, ex-arcebispo.

Campo Grande News - A Igreja orienta o homem a preservar o planeta. Mato Grosso do Sul abriga cerrado, Pantanal, Bonito. Na sua opinião, qual o papel da Igreja na questão ambiental?

Em 1979, ano da minha formatura na engenharia, a CNBB lançou a primeira campanha de cunho ecológico. Há 32 anos, o tema era “Preserve o que é de Todos”. Vieram temas sobre a água, Amazônia, aquecimento global. O tema ecológico tem preocupado a igreja no Brasil e no mundo.

A nossa colaboração maior é sempre no plano da conscientização, a igreja não tem operatividade e nem é nossa função. Mas trabalhar nos planos dos valores, formação ética, cidadania. Sem dúvida, aqui tem muito campo para se fazer isso.

Campo Grande News – Como o senhor avalia a perda de fiéis do catolicismo para outras igrejas, como as evangélicas? E movimentos como renovação carismática, padres cantores?

Existe hoje um problema não só da igreja católica, um problema cultural , efeito da globalização, que é o despertar da subjetividade de maneira muito exacerbada. Foi resgata a partir de Descarte, mas depois veio o Iluminismo, o adeus à razão. Sobretudo depois que se viu que a ciência não explicava tudo.

A ciência poderia produzir a bomba atômica e destruir o mundo. Hoje, existe corrente da filosofia que fala do pensamento fraco, que o ser humano não é capaz de conhecer a verdade, apenas a verossimilhança. Tem o papa João Paulo II dizendo que a fé e a razão são as duas asas através do qual o entendimento humano alça voo na busca da verdade.

Mas o fato é que existe um subjetivismo muito grande, mais do que nos tempos do pré-socráticos a pessoa se torna a medida de todas as coisas.

No ponto de vista da religião, existe um problema sério, que os estudiosos chamam de bricolagem. Cada um adere aos conceitos que escolhe. Pega a reencarnação do espiritismo, a intercessão dos santos da igreja católica, pega o descarrego da umbanda, etc.

Existe hoje, há algumas décadas, uma volta ao sagrado. Agora, isso significa que na cidade grande, há o mercado do simbólico. Ofertas que vão desde coisas sérias de engajamento da fé, que se traduz em obras, até agências de prestação de serviço religioso. Aonde a pessoa vai, paga, recebe as orações que quer e vai embora. Não assume compromisso nenhum, se fala até em entretenimento religioso.

O problema da dupla pertença é realidade e temos que ter presente na ação pastoral. Não é que hoje tem católicos praticantes ou não praticantes. É mais sério, existe aquele que mesmo sendo católicos praticantes não aderem ainda à fé da igreja na sua inteireza.

A necessidade de formação permanente é significativa. Temos que desenvolver nas pessoas o sentido de pertença. Já em 1999, o Reginaldo Prandi já dizia que religião hoje não é mais herança, é opção. A pessoa a cada momento precisa justificar a própria fé.

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