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Capital

De um lado a outro, chuva preocupa moradores de áreas pobres de Campo Grande

Jeozadaque Garcia | 30/01/2012 21:08

Da Cidade de Deus até a Portelinha do Segredo, do outro lado da cidade, famílias carentes sofrem com o tempo das águas

Moradora da Cidade de Deus, Andriela sofre com as chuvas e ajuda a vizinha Luciene, que perdeu a casa. (Foto: João Garrigó)
Moradora da Cidade de Deus, Andriela sofre com as chuvas e ajuda a vizinha Luciene, que perdeu a casa. (Foto: João Garrigó)

As chuvas constantes que caem em Campo Grande desde a última quinta-feira (26) expõem velhos e conhecidos problemas que enfrentam moradores de duas das regiões mais carentes da Capital: Cidade de Deus, no Parque do Sol, e Portelinha do Segredo, do outro lado da cidade, na região do Estrela do Sul.

Alheios aos estragos que as chuvas causaram nas avenidas da região central da cidade, os moradores viram o pouco que têm ser levado pela enxurrada.

“Nosso mantimento está acabando. O pouco que tinha molhou ou foi furtado depois da última chuva”, conta Andriela Aparecida, de 25 anos, que mora na Cidade de Deus há um ano com um casal de filhos.

Na chuva desta quinta-feira, a água invadiu novamente a casa da catadora de lixo e os poucos móveis tiveram que ser novamente acomodados sobre a cama e alguns bancos. Ela vive com uma renda semanal de R$ 60 e abriga a vizinha, grávida de gêmeos, que perdeu o barraco na última quinta.

“Reparto o pouco que tenho com minha vizinha. Temos alimentos para mais dois dias. Depois disso não sei como vai ser”, lamenta. Hoje o almoço foi maracarrão com feijão. Já no jantar, Andriela não sabe o que vai preparar. “Pode olhar lá. Só tem água”, aponta.

Luciene, grávida de gêmeos, tem outros quatro filhos. (Foto: João Garrigó)
Luciene, grávida de gêmeos, tem outros quatro filhos. (Foto: João Garrigó)

Luciene Mendes, de 32 anos, que está grávida de quatro meses, trabalha como diarista e hoje conta com a ajuda de Andriela. Com o barraco, toda a comida e as roupas dos bebês foram carregados pela água.

“Fui mandada embora do meu emprego porque saí correndo de lá quando me falaram que minha casa tinha caído. Minha patroa só me ligou e disse pra eu ir receber. Mas o que você faz quando alguém te liga avisando que sua casa está caindo?”, questiona, com os olhos marejados.

Com tábuas e lonas emprestadas, ela ergueu um novo barraco ao lado do que caiu durante a última chuva. Além disso, como teve que dormir fora, perdeu ainda gás, panelas, roupas e um aparelho de DVD, que foram furtados por outros moradores.

“Estou desesperada por roupinhas de bebê. Meu sonho é ter meu terreno. Não tem condições de criança ficar aqui”, finaliza.

Além dos gêmeos que espera, Luciene tem outros quatro filhos. “Todos fortes”, diz, urgulhosa.

“Todos aqui sofrem com a chuva. E olha que são 150 famílias”, diz moradora da Portelinha do Segredo. (Foto: João Garrigó)
“Todos aqui sofrem com a chuva. E olha que são 150 famílias”, diz moradora da Portelinha do Segredo. (Foto: João Garrigó)

“Graças a Deus não choveu” - Enquanto os moradores da Cidade de Deus ainda sofrem com a chuva, do outro lado da cidade o sol predomina, porém, os estragos da última precipitação ainda estão na memória.

“Graças a Deus hoje não choveu”, diz, aliviada, a presidente da associação dos moradores da Portelinha do Segredo, Mariluce Oliveira.

Ela, que mora há cinco anos no local, conta que ficou até as 3h de sexta-feira contabilizando os prejuízos e limpando o que ainda pode ser aproveitado. A água levou tapete, sapatos, roupas e ainda estragou um sofá novo. “Todos aqui sofrem com a chuva. E olha que são 150 famílias”, conta.

Além da enxurrada, as cheias do Córrego Segredo levam animais peçonhentos vão para dentro dos barracos.

Filho de Tainara já foi picado por cobra às margens do Córrego Segredo. (Foto: João Garrigó)
Filho de Tainara já foi picado por cobra às margens do Córrego Segredo. (Foto: João Garrigó)

“Não podemos ficar nessa situação. Aqui vem aranha, cobra, escorpião. Vez ou outra chega nas casas”, conta a dona de casa Tainara Oliveira, de 24 anos, que mora em um barraco com o esposo e três filhos. Um deles, inclusive, foi picado por uma cobra jararaca às margens do Segredo no ano passado.

De acordo com ela, todo ano a mesma promessa se repete: “Sempre falam que vão nos tirar daqui. Nem acreditamos mais. E se tirar, vamos pra onde?”, pergunta, rodeada pelos filhos.

Sozinho e com 66 anos, o camapuanense Dejanir Rocha não tira o sorriso do rosto. Recém recuperado de uma cirurgia – ele foi esfaqueado após um desentendimento -, conta com bom humor sobre a última noite de chuva.

Dejanir conta que já perdeu “umas tantas vassouras” limpando barro de sua casa, que tem chão de cimento. (Foto: João Garrigó)
Dejanir conta que já perdeu “umas tantas vassouras” limpando barro de sua casa, que tem chão de cimento. (Foto: João Garrigó)

“Eu estava operado e acudindo as coisas. Já perdi TV, colchão. Ainda bem que não tem muita goteira, eu coloco lona. Aqui é assim: choveu, a gente fica em alerta”, conta.

Apesar dos percalços, o aposentado diz que já “perdeu as contas” de quantas vezes acordou no meio da noite para salvar os poucos móveis que tem. E depois, quando amanhece, começa, sem desanimar, a “arrumação”.

“Já gastei umas tantas vassouras esfregando o chão de cimento cheio de barro, pra limpar aqui”, finaliza.

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