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Capital

Enquanto 2 recebem tratamento, 8 moram na rua e vivem com psicose

“A internação involuntária é o último recurso, não é uma medida que possa ser banalizada”, explica coordenadora da Sesau

Izabela Sanchez | 19/02/2020 12:59
Com 23 anos, depois de 6 meses de tentativa, jovem foi levado de forma involuntária para tratamento (Foto: Arquivo/Campo Grande News)
Com 23 anos, depois de 6 meses de tentativa, jovem foi levado de forma involuntária para tratamento (Foto: Arquivo/Campo Grande News)

“A pior parte de ter uma doença mental é que as pessoas esperam que você se comporte como se não tivesse”. Uma das frases mais impactantes do filme Coringa, que rendeu ao ator Joaquin Phoenix o Oscar de melhor ator, é a rotina de, pelo menos, 8 pessoas nas ruas de Campo Grande. Para eles, que têm o céu como teto, viver com a psicose é componente que deixa a vida ainda mais vulnerável e em risco.

O número foi identificado pela Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) por meio da Coordenação de Atenção Psicossocial. Há quase 1 ano, junto com a SAS (Secretaria de Assistência Social), a coordenação move o Programa “Atenda”, que busca cuidar e tratar quem vive em situação de rua e, além da dependência química, enfrenta transtornos mentais.

A maioria, conforme explicou a coordenadora e psiquiatra Ana Carolina Guimarães, apresenta sintomas psicóticos que envolvem uma percepção diferente da realidade, de si mesmo e dos outros. Delírios, manias de perseguições e locomoção constante faz com que o atendimento a essas pessoas tenha de ser específico, rotineiro, especialmente pela medicação.

É por isso que após diversas tentativas e atendimentos por meses, com equipe que o visitava toda semana na “casa de rua”, jovem de 23 anos foi levado de forma involuntária para ser internado no CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) da Vila Almeida. A internação involuntária depende de ato médico, uma avaliação que determine que uma pessoa represente risco de vida para si e para os outros.

A internação involuntária é regulamentada pela lei federal 10.216, de 2001, que exige atendimento médico que comprove a necessidade e que, no prazo de 72h, a decisão seja comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha ocorrido.

Ana Carolina afirma que não há prazo máximo, estabelecido, para que o tratamento de internação psiquiátrica do jovem chegue ao fim e que esse prazo será estabelecido de acordo com o avanço do tratamento. Segundo a lei federal, ainda assim, a internação termina se o responsável da família ou responsável legal pedir que ela acabe.

Médica psiquiatra, Ana Carolina Guimarães é coordenadora de atenção psicossocial da Sesau (Foto: Divulgação/PMCG)
Médica psiquiatra, Ana Carolina Guimarães é coordenadora de atenção psicossocial da Sesau (Foto: Divulgação/PMCG)

Famílias quebradas – Um dos problemas “mora” aí. A maioria das pessoas que vivem em situação de rua vem de lares quebrados e, muitas vezes, essas pessoas foram expulsas do contato familiar. Em outros casos, têm laços frágeis com familiares também incapazes de ajudá-los.

É o caso do paciente levado ao CAPS Vila Almeida. Segundo a coordenadora, o único contato familiar do jovem de 23 anos é a avó, uma idosa que não tem condições de ajudá-lo.

Além dele, outra paciente, que não teve o nome divulgado, também está internada realizando tratamento multidisciplinar para a psicose. Resgatada na região do bairro Guanandi, ela ainda sofre de tuberculose e outras patologias que tornam o caso mais complicado, conforme explicou Ana Carolina.

“É um caso especial, a gente tentou várias vezes, às vezes ela queria, às vezes não. Quando tem um lugar fixo, a equipe vai ao mesmo lugar. É mais difícil quando tem um comportamento andarilho”, explica a coordenadora. “Ele tem só uma avó idosa, e a outra paciente, tem uma mãe já idosa, as família é frágil”, conta.

A equipe do programa Atenda é formada por médico, assistente social e profissional do “consultório de rua”, outro programa da SAS. Segundo a coordenadora de assistência psicossocial da Sesau, 7 pessoas deixaram de estar vulneráveis a situação extrema de risco nas ruas de Campo Grande, e dessas, 5 estão morando em residências terapêuticas.

“A gente já faz segmento de vários outros pacientes que estavam em situação de risco e que agora não estão mais. A internação involuntária é o último recurso, não é uma medida que possa ser banalizada. Esses pacientes com transtorno de mental, é sempre uma avaliação da equipe que inclui um psiquiatra, são pessoas treinadas”, explicou a coordenadora.

A parte mais difícil de ser realizada, segundo ela, é o fim de todas as etapas: a reinserção social. Hoje, entre os 7 tirados de risco, nenhum conseguiu trabalho. Enquanto ficam no CAPS, o tratamento inclui leito, suporte social e educativo, terapia e medicamentos.

As residências terapêuticas também inclui acompanhamento, mas nem esses locais, nem os CAPS, segundo a 32ª Promotoria de Justiça de Campo Grande, existem em número e estrutura suficiente para atender a imensa demanda da Capital.

“Essa é a parte mais complexa, esse é um trabalho em reabilitação, que envolve tirar documentos, tentar que tenham ter alguma renda, ou se vai para residência, todo esse trabalho social leva muito tempo”, explicou.

Alcançar quem não alcança – Ana Carolina comentou que o programa surgiu para alcançar quem, sozinho, não alcança a rede de atenção psicossocial. “Surgiu da necessidade de fazer um segmento das pessoas que não conseguem chegar ao serviço de saúde, mas que estão gravemente adoecidas”.

“Ele estava sendo acompanhado pelo atendimento há mais de 6 meses, a equipe toda semana ia vê-lo, ia convencê-lo. Alguns pacientes pela condição, já conseguem frequentar o CAPS, tem outros como ele que estão só piorando, se colocando em situação em de risco”, comentou.

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