Na favela, todo dia é de brincadeira para quem se diverte com pouco

Para as crianças da favela "Só Por Deus", no extremo sul de Campo Grande, 12 outubro é uma data como qualquer outra. Claro, é o dia delas e boa parte até sabe o quanto esta quarta-feira (12), poderia ser especial, mas, se o dinheiro da família é regrado até para comprar o que comer, elas também entendem que um brinquedo mais sofisticado ou uma programação diferente do “normal” são desejos que podem ficar em segundo plano.
Indiferentes à precariedade dos barracos onde vivem e à falta de estrutura que inclui não ter onde brincar, a diversão das crianças que vivem no local é à base do improviso. O campo de futebol de areia onde a favela se formou, há pouco mais de um mês, é o ponto de encontro perfeito, aos fins de tarde, para cerca de 50 crianças.
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Os garotinhos também brincam de gente grande enquanto que se fazem de “cerqueiros” fincando os postes no entorno dos barracos. A caixa d'água cheia vira a piscina perfeita sob o sol de 30° C em Campo Grande.
Neste Dia das Crianças, a “piscininha” vai continuar sendo a principal distração dos quatro filhos de Elci Pereira Bento, de 30 anos. “Todo o ano eu tento fazer ao menos um bolinho. Mas dessa vez não vai dar”, comenta. Para o local ela se mudou pelo mesmo motivo que a maioria dos outros moradores.
“Até hoje devemos o aluguel da casa onde a gente morava antes de vim para cá. Então não tem como fazer algo especial para eles, porque o pouco dinheiro que temos gastamos com o que é mais necessário. Mas essa caixa cheia aí é a maior diversão deles”, comenta a desempregada, apontando orgulhosa para os filhos de 4, 10,12 e 13 anos.


O Vitor Vinicius, de apenas 6 anos, queria um carrinho de controle remoto. Seu irmãozinho Kéllison, de 4, também. Diante dos pedidos a mãe e dona de casa, Simone de Oliveira, de 23 anos, só deseja um dia também poder atender a vontade dos filhos.
“Não vai dar não meninos”, se queixa. Mas este ano, para data não passar em branco ela conta que com o dinheiro que vai ganhar vendendo geladinhos, talvez dê para comprar uma lembrancinha.
“Eles sabem que é dia de presentes, então eu sempre tento arrumar alguma coisa para eles. Nada muito caro”, comenta. Mas ela garante que mesmo diante das dificuldades a criançada por lá, faz a festa, independente de ser dia das crianças ou não.
“Eles se juntam, pulam, saem correndo por aí e a gente tem sempre que ficar de olho porque se deixar eles saem correndo pela rua e aí fica perigoso”, ri.
A Iris Vitória, de 5 anos, não se conforma até agora por ter ficado doente e ter perdido, justo o dia de aula em que todos os alunos tiveram atividades em alusão a data, na última semana.
A avó, Mirian dos Santos, de 54 anos, sente pela neta. “Ela teve catapora e eu tive que levar ela no posto de saúde. No outro dia, depois que voltou da aula ela ainda reclamou: vó teve brincadeira, cachorro-quente, brinquedo e eu não fui”, se queixou. O dia 12 também vai passar em branco para menina.
Só Por Deus – Ocupado há pouco mais de um mês o campo de futebol na Rua Araraquara no Jardim Canguru, que hoje divide espaço com a nova favela, já conta com aproximadamente 200 barracos. A maioria dos moradores esta ali, fugindo do aluguel.
A quantidade de crianças é de aproximadamente 50 e de todas as idades. Interessados em fazer doações de brinquedos no próximo dia 12, podem ir direto ao local, que fica no cruzamento entre a rua Araraquara e rua Evaristo Ferreira, no bairro.