Para impedir pulverização de veneno, indígenas voltam a ocupar fazenda em MS
Ato iniciado pela comunidade neste domingo (21) reivindica a presença da Funai e da Força Nacional

Sob a alegação de impedir o uso de agrotóxicos, indígenas guarani-kaiowá da TI (Terra Indígena) fecharam a porteira e ocuparam a Fazenda Ipuitã, em Caarapó, a 274 km de Campo Grande, neste domingo (21). Desde 2019, a comunidade denuncia casos de intoxicação pelo uso de agrotóxicos próximo à área ocupada.
RESUMO
Nossa ferramenta de IA resume a notícia para você!
A informação foi divulgada pelo Cimi (Conselho Indigenista Missionário). Em nota, a entidade afirmou que equipes da Polícia Civil, da Polícia Militar e do DOF (Departamento de Operações de Fronteira) estiveram no local alegando a existência de reféns, o que foi negado pelos indígenas. Até o momento, não há registro de confronto ou agressões entre fazendeiros e ocupantes.
- Leia Também
- Operação combate uso irregular de agrotóxicos em Terra Indígena de MS
- Réu por crimes contra indígenas, fazendeiro é investigado por uso de agrotóxico
O delegado titular do DOF, Guilherme Scucuglia, disse ao Campo Grande News que a corporação “monitora a situação”, mas não confirmou o envio de policiais à área.
De acordo com Matias Rempel, coordenador do Cimi, a comunidade relatou vários episódios de pulverização neste ano. Ele destacou que mulheres, crianças e anciãos compõem a maioria da retomada e que os indígenas pedem a mediação da Funai, acompanhada da Força Nacional.
“Na verdade, tem dois motivos para a retomada. Há uma situação objetiva, que é a violação: os agrotóxicos despejados contra a comunidade envenenam as pessoas e destroem qualquer possibilidade mínima de soberania alimentar, trazendo fome. O próprio veneno fere a produção e, ao mesmo tempo, transforma o lugar em um paraíso para insetos que fogem da pulverização e encontram ali uma ilha de alimentos”, explica Matias.
Ele acrescenta que, em mais de uma ocasião, aulas foram interrompidas na escola indígena devido à contaminação. “É uma violação a mais que, junto com as ameaças e a vida violada, fez a comunidade perder a paciência. Então, no final, eles avançam para garantir mais um pedaço da área enquanto a demarcação é negligenciada”.
Segundo Matias, o estopim da ocupação foi justamente a intensificação das pulverizações. “A grande pauta é a demarcação porque garante que as violações sejam tratadas estruturalmente. Porém, nesse caso concreto, o estopim da retomada foi a situação dos agrotóxicos.”
Em nota, o Cimi alerta para o risco de novos episódios de violência, sobretudo à noite. “A própria TI Guyraroká sofreu, na história recente, um conjunto de violências decorrente da disputa fundiária, registrando remoções forçadas, ameaças, agressões e atropelamentos”, diz a entidade.
Além disso, segundo Matias, até as 16h deste domingo, a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) não havia comparecido à retomada, e a chegada da Força Nacional ainda era aguardada pelos indígenas.
A reportagem entrou em contato com a Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública) para saber qual foi a atuação do DOF e dos demais policiais na ocorrência e se de fato havia reféns no local. O espaço segue aberto para manifestação da pasta.
Denúncias recorrentes - Conforme noticiado em outubro do ano passado, indígenas registraram em vídeo um avião pulverizando agrotóxicos sobre a Terra Indígena Guyraroká. A “chuva tóxica” atingiu casas, a escola e áreas de circulação. Desde 2018, fazendeiros no entorno do território vêm sendo acusados de despejar produtos químicos sobre as aldeias.
A comunidade, composta por cerca de 90 indígenas, ocupa pouco mais de 50 hectares cercados por monoculturas e perdeu recentemente quatro toneladas de sementes devido ao avanço de insetos e micro-organismos atraídos pela degradação ambiental causada pelos venenos, segundo o Cimi.
É importante mencionar que a Terra Indígena Guyraroká foi declarada de posse tradicional dos guarani-kaiowá em 2009 pelo Ministério da Justiça.

O MPF (Ministério Público Federal) já ajuizou ações civis públicas para conter o uso irregular de agrotóxicos em Caarapó. Em 2019, quatro crianças e dois adolescentes precisaram de atendimento médico após intoxicação causada por produtos aplicados em uma fazenda vizinha, localizada a apenas 50 metros da escola indígena.
Em julho deste ano, operação conjunta do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), da Força Nacional e das polícias resultou na apreensão de 202 quilos de agrotóxicos contrabandeados do Paraguai em depósitos clandestinos dentro de uma fazenda situada em área declarada como Terra Indígena Guyraroká.
Receba as principais notícias do Estado pelo Whats. Clique aqui para acessar o canal do Campo Grande News e siga nossas redes sociais.