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Compartilhando Justiça

O Ato ilegal nem sempre é improbidade administrativa

Dr Davi Nogueira Lopes | 20/11/2019 11:05
(Foto: Divulgação)
(Foto: Divulgação)

O ano das eleições municipais está quase aí, e parece estar difundido entre pretensos candidatos à chefia do Executivo o temor de que o diploma de eleição traga, junto com o cargo, a certeza de um futuro processo por improbidade administrativa. Um equívoco, que precisa ser esclarecido.
A Lei de Improbidade Administrativa combate os atos que importem em lesão ao patrimônio público; que geram enriquecimento ilícito do agente; e aqueles que ferem os princípios da administração pública previstos na Constituição Federal, que são a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência.

Não há aqui espaço para tratar em detalhes o conceito de todos os elementos que configuram improbidade, e por isso vamos nos ater a um ponto específico, que é aquele ato do prefeito, ou agente público, que acaba ferindo algum dever legal. Será ele um ato de improbidade administrativa porque feriu o princípio da legalidade?

A primeira resposta é a que parece mais óbvia: um ato que seja ilegal será sempre um ato de improbidade administrativa. Foi esse entendimento que no ano de 2014 levou o Ministério Público a processar por improbidade administrativa a Vice-Prefeita do Município de Foz do Iguaçu depois que ela mesmo enviou uma carta ao MP para informar que havia utilizado, temporariamente, o dinheiro que estava sobrando na conta da iluminação pública para impedir o fechamento do Hospital Municipal, inclusive do centro de hemodiálise.

O entendimento do Ministério Público paranaense, naquele caso, foi de que “quem quer que utilize dinheiro público terá de verificar seu bom e regular emprego, na conformidade das leis, regulamentos e normas emanadas das autoridades administrativas competentes, ou seja: quem gastar, tem de gastar de acordo com a Lei”.

De tão emblemático, esse caso nos levou a escrever um artigo intitulado “A CLÁUSULA DA PRIORIDADE CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS: O CASO DE FOZ DO IGUAÇU”, publicado na revista do programa de mestrado da Faculdade de Direito do Sul de Minas (https://www.fdsm.edu.br/mestrado/revista_artigo.php?artigo=228&volume=).

Ali, defendemos a atitude corajosa da Vice-Prefeita, de afrontar a lei para garantir o atendimento hospitalar a centenas de pessoas carentes, que dependem do SUS, inclusive de quem dependia de hemodiálise para viver.

Na verdade, afrontar a lei nem sempre será improbidade administrativa. Improbidade significa algo que seja contrário à moralidade, às regras éticas que devem guiar o administrador público. Não é possível que se veja improbidade no ato que visa salvar a vida de pessoas.

John Finnis, um jurista e filósofo australiano, diz que dependemos de algumas instituições para garantia de bens preciosos ao ser humano, dentre os quais está, em primeiro lugar, a própria vida, vista aqui num sentido mais amplo, de vida saudável.

Pois bem, a Administração Pública é, por definição, uma instituição voltada justamente para promover o bem comum, ou interesse público, para garantir, na máxima medida possível, os bens preciosos ao ser humano.

Por isso, o agir moral do administrador público não se confunde necessariamente com cumprir a lei. No caso de Foz do Iguaçu, a lei precisou ser desrespeitada para impedir a paralização das atividades de um hospital municipal.

Mas, além disso, há também aqueles atos que o administrador pratica sem saber que está descumprindo a lei. São chamados por alguns de “atos de má gestão”. Eles também não podem ser considerados atos de improbidade administrativa, porque não há desonestidade na sua prática.
É isso que precisa ficar claro. É preciso haver desonestidade para que realmente se possa dizer que houve improbidade administrativa, sob pena de se condenar severamente um ato que no fundo não passou de um erro, a que todos estão sujeitos.

E para que haja desonestidade, é preciso que o agente público haja com dolo ou culpa, isto é, com vontade de lesionar o erário, de promover o enriquecimento ilícito ou de ferir algum daqueles princípios constitucionais, ou, ao menos, que seja negligente ou imprudente em seu dever de bem cuidar da coisa pública.

Enfim, é um equívoco pensar que qualquer ato ilegal praticado por agente público seja também um ato de improbidade administrativa.

Dr Davi Nogueira Lopes - Advogado
Dr Davi Nogueira Lopes - Advogado

Davi Nogueira Lopes

Mestre em Direito (UFMS). Pós-Graduado em Direito Constitucional (PUC-SP). Advogado e sócio do escritório LIMA, PEGOLO & BRITO ADVOCACIA. www.lpbadvocacia.com.br.

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