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Comportamento

Feriado é só pausa para esquecer dos boletos que não param de chegar

Guilherme Henri | 01/05/2018 07:10
Pedreiro Donizete Corrêa, 47 anos, na Rua da Paz (Foto: Saul Schramm)
Pedreiro Donizete Corrêa, 47 anos, na Rua da Paz (Foto: Saul Schramm)

O dia é do assalariado, do ambulante, do sujeito que, faça chuva, faça sol, tem de levantar da cama para suar a camisa e, se tiver sorte, com Carteira assinada, vai gozar de 30 dias de férias por ano, até que o governo resolva também mudar essa regra. 

E qual a razão de trabalhar tanto? Comprar uma casa? Pagar a faculdade do filho? Mudar de vida? Pelas ruas de Campo Grande, em uma segunda-feira em que alguns sortudos puderam emendar o feriado, quem teve de ralar nem pensou nesse tipo de resposta. Pelos relatos que encontramos, o trabalhador de 2018 só consegue pensar a curtíssimo prazo.

A expressão cansada responde por si só: o dinheiro dá apenas para pagar dívidas do mês e comer. E com isso, planos se tornaram cada vez mais modestos e distantes.

Cícero Firmino da Silva, 54 anos, é ambulante há 30 anos (Foto: Saul Schramm)
Cícero Firmino da Silva, 54 anos, é ambulante há 30 anos (Foto: Saul Schramm)

No “Centrão”, o ambulante Cícero Firmino da Silva, 54 anos, logo dispara: “Cheguei num ponto que já não tenho plano nenhum e só trabalho para cumprir com os deveres diários e não ficar com fama na praça de caloteiro”, diz o vendedor de meias, sobre os boletos que não falham.

O ambulante ainda faz questão de completar o pensamento afirmando que com o que se ganha hoje não dá para pensar em mais nada do que pagar as contas e comer. “Sou ambulante há 30 anos. Na luta. E depois desse tempo todo querendo conquistar alguma coisa, cheguei a conclusão que dessa vida não se leva é nada”, desabafa.

O relógio marcava pouco mais de 9h e o pedreiro Donizete Corrêa, 47 anos, já batia massa na calçada da Rua da Paz. Ele conta que está no batente há “20 e poucos anos” e hoje trabalha para tentar um dia comprar uma chácara, onde pretende desfrutar talvez uma aposentadoria. “Vixe, tá longe de conseguir isso em. Aliás, parece que cada vez fica mais difícil de se conquistar alguma coisa”, acredita.

E feriado prolongado também é dia de varrer calçada. Mas, não a de casa e sim a da firma. A auxiliar Inês Maria Rodrigues, 35 anos, conta que trabalha desde os 7 anos. De lá para cá, as coisas não mudaram muito, pois o dinheiro suado continua sendo para ajudar no sustento da família.

Inês Maria Rodrigues, 35 anos, trabalha desde os 7 anos para ajudar em casa (Foto: Saul Schramm)
Inês Maria Rodrigues, 35 anos, trabalha desde os 7 anos para ajudar em casa (Foto: Saul Schramm)

Porém, ela é uma daquelas que não perdeu a esperança e também levanta todos os dias para trabalhar almejando um dia cruzar os portões da faculdade, que fica logo ali, virando a esquina. “Ainda tá meio distante. Mas, se Deus quiser eu chego lá. Quero estudar Pedagogia”, sonha.

Ao lado dela, a companheira de trabalho Eliza Mendes Ortiz, 33 anos, até compartilha do mesmo objetivo, estudar Pedagogia, porém, primeiro diz que acorda todos os dias pensando em ganhar dinheiro para ajudar os filhos, que já estão com 17, 13 e 8 anos. “Parece que para o trabalhador tudo é mais difícil mesmo. Meus filhos estudam e quero que todos façam faculdade, mas hoje isso não é possível nem pra mim”, conta.

Otimista, o porteiro Fernando Pereira da Silva, 25 anos, também trabalha desde os 14 anos e hoje levanta cedo para garantir que os filhos de 5 e 2 anos, no futuro, possam cursar uma universidade.

Eliza Mendes Ortiz, 33 anos, trabalha todos os dias para um dia conseguir cursar Pedagogia (Foto: Saul Schramm)
Eliza Mendes Ortiz, 33 anos, trabalha todos os dias para um dia conseguir cursar Pedagogia (Foto: Saul Schramm)
Fernando Pereira da Silva, 25 anos, trabalha para no futuro conseguir bancar faculdade dos filhos (Foto: Saul Schramm)
Fernando Pereira da Silva, 25 anos, trabalha para no futuro conseguir bancar faculdade dos filhos (Foto: Saul Schramm)

“Admito que se esse momento fosse hoje eu não teria condições de bancar nenhum deles. Mas, acho que é possível sim conquistar o que se quer e isso não está tão distante. Na verdade, acho que tudo depende do que se planeja”, diz.

Mas Gedião da Costa França, 43 anos, é prova viva de que trabalhar muito e duro todos os dias não é sinal que todos os objetivos serão alcançados. Vigia, montador de móveis e marceneiro, faz de tudo um pouco e até agora não conseguir nem sequer ampliar a garagem de casa, onde quer abrir uma lojinha e vender o que produz. “É trabalhando muito e pagando conta. Hoje se tornou mais difícil se planejar. Na verdade, você até chega a pensar alguma coisa, mas todo começo de mês isso fica de escanteio”, comenta.

Gedião da Costa França, 43 anos, tem três empregos e só quer ampliar garagem da casa (Foto: Saul Schramm)
Gedião da Costa França, 43 anos, tem três empregos e só quer ampliar garagem da casa (Foto: Saul Schramm)
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