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Comportamento

Ivan se equilibra todos os dias entre escada e facas pensando nos filhos

Simpático, o malabarista chama atenção nas ruas pelo equilíbrio e a coragem de fazer arte com facões.

Thailla Torres | 08/05/2019 08:25
Em cima de uma escada, Ivan faz malabarismo com facões. (Foto: Kísie Ainoã)
Em cima de uma escada, Ivan faz malabarismo com facões. (Foto: Kísie Ainoã)

No tempo que o semáforo ficou fechado, em frente a loja de vestidos caros, na Avenida Afonso Pena, o homem magrelo, sujo, de olhos verdes, me fez a seguinte pergunta: “Você acha, moça, que eu devo deixar minhas crianças com vontade de comer bolacha?”.

Respondi com sorriso e compreendi que o tom de sua frase não foi uma interrogação. Mas um dos motivos que o faz sair todos os dias do Jardim Noroeste para se equilibrar em cima de uma escada e fazer malabarismo com facões, mesmo que a maioria ao volante não abra o vidro para contribuir com alguns trocados.

Aos 37 anos, Ivan Rocha Brito é artista de rua conhecido nos semáforos da cidade. Quando não está na Afonso Pena, ele se apresenta com sua escada de ferro na Avenida Mato Grosso, Via Parque ou Rua 13 de Maio.

Trabalho é feito para sustentar a família e o sorriso do público. (Foto: Kísie Ainoã)
Trabalho é feito para sustentar a família e o sorriso do público. (Foto: Kísie Ainoã)

Trabalhando há 7 anos nas ruas, ele diz que é pai de 7 filhos, mas cria apenas três com a atual esposa. Do malabarismo ele tira o sustento, e sua companheira ganha dinheiro plantando verduras no quintal de casa. “Ela tem uma roça e levanta quatro horas da manhã para cuidar”, conta.

Já Ivan diz que não abre mão de acordar as 8h ou 9h, descansado e disposto a se equilibrar nas ruas. Seu número é daqueles que impressiona porque ele quase não perde o equilíbrio. E quando finge que engoliu um dos facões, esse é o momento de ganhar um dinheiro ou diversos olhinhos de espanto de crianças que assistem o “espetáculo” pela janela do carro.

O que Ivan ganha não é muito, mas ele garante que dá pra comprar comida. Mas não é só isso que o mantém nas ruas. Ele jura que a curiosidade do público também motiva, mesmo debaixo de sol quente ou garoa. “Você acha que pobre vai ver um espetáculo desse como o meu? Lógico que não. Circo é caro e arte não está em todo lugar. Ainda falta muita arte nessa cidade”.

Bem-humorado, o jeito de falar denuncia a origem de fora. “Sou de Sinop (MT), cidade animada, de um estado que tem boemia de verdade”, brinca. Mas ele também não desfaz de Campo Grande. “As pessoas aqui ainda precisam saber o que é se misturar, mas hoje a cidade está gostosa de viver. Antigamente se eu fizesse isso seria preso, só por estar com os facões na mão”.

Simpático, Ivan fala do seu amor pelas ruas. (Foto: Kísie Ainoã)
Simpático, Ivan fala do seu amor pelas ruas. (Foto: Kísie Ainoã)

Os objetos não têm fios para cortar facilmente, no entanto, basta um minuto de descuido para machucar o rosto caso desequilibre. “É preciso ter atenção. Mas eu estou acostumado, são sete anos de malabarismo e três em cima da escada”.

Ivan não leva a escada para casa por causa do peso. “Sempre deixo em algum cantinho, próximo ao lugar que vou trabalhar no dia seguinte, depois só vou mudando a minha rota”.

Aprendeu olhando um artista argentino, conta. “Ele é muito bom, eu ainda não sou nem metade do que ele é em equilíbrio. Mas quando conheci ele nas ruas, aprendi em uma semana”, conta.

Depois de alguns minutos de entrevista, Ivan não podia mais perder tempo. Os poucos segundos que tem para oferecer o chapéu no semáforo são preciosos. Se despediu com sorriso imenso e foi se equilibrar para garantir o sorriso dos filhos e de quem o assiste de dentro do carro.

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