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Comportamento

No trabalho, Val supera morte do filho e da irmã realizando a vontade dos dois

Foram duas perdas em menos de uma semana, parecia estar no meio do furacão, mas Val preferiu seguir em frente

Alana Portela | 29/06/2019 07:31
Valdynéia decidiu seguir a vida e realizar vontade do filho e da irmã (Foto: Alana Portela)
Valdynéia decidiu seguir a vida e realizar vontade do filho e da irmã (Foto: Alana Portela)

Superar o luto não é uma tarefa fácil, principalmente, quando as perdas são uma seguida da outra. Contudo, é preciso ser forte, guardar o amor que ficou no coração e seguir em frente pelos que não puderam chegar até aqui. Dessa forma, Valdynéia Antunes, carinhosamente chamada de Val, supera a perda do filho, Alexander Floriano, e da irmã Márcia Antunes, trabalhando na Recromasul (Associação Doentes Renais Crônicos) de Campo Grande.

“É uma continuação do trabalho que eles queriam fazer. Meu filho era policial da base, jovem, tinha muitos sonhos, a gana de viver, fazia coisas para incentivar os outros. Ele e a Márcia eram iguais, generosos. Tem dias que bate a tristeza, mas lembro que eles não iriam gostar de saber que não estou bem”, conta Val.

A história é longa e as perdas são recentes. Apesar disso, ela tem a expressão de contente, como se estivesse orgulhosa de ter chegado até aqui e, claro, das pessoas que amava incondicionalmente.

Foram duas perdas, a partida precoce do filho aos 19 anos, no dia 23, e o falecimento da irmã no dia 25 de setembro de 2017. Sentada na cadeira dentro da sala onde trabalha, Val dá início aos relatos.

Val ao lado do filho Alexander durante a formatura na Base Aérea (Foto: Arquivo pessoal)
Val ao lado do filho Alexander durante a formatura na Base Aérea (Foto: Arquivo pessoal)

“Começou com a minha irmã, ela tinha problemas renais há 23 anos. Foi para a praia entre janeiro e fevereiro, passou mal e quando retornou, começou a ter outros sintomas. Fomos em um clínico até procurar um especialista. Pediu a ressonância magnética, que acusou câncer no rim. O médico chamou eu e meu cunhado, disse que ela teria apenas seis meses de vida. Não fez quimioterapia, somente um tratamento com injeções para dar sobrevida”, lembra.

Val fala como foi descobrir o câncer e ideia de não revelar a verdade para a irmã. “Quando os médicos descobriram já estava enraizado, com metástase. Na época trabalhava meio período e de manhã fazia companhia a ela, levava ao médico. Sempre unidas, éramos quatro irmãos. Certa vez, estava no meu trabalho e meu cunhado ligou desesperado porque a médica foi visitar e falou do tempo de vida”, recorda.

O tratamento de Márcia com injeção se iniciou e elas conseguiram atendimento em casa do  Hospital de Câncer. Uma enfermeira ia até o local e aplicava a morfina, para aliviar a dor da paciente. Val revezava com outros familiares os cuidados com a irmã, e a levava na hemodiálise. Os meses foram passando e cada vez mais, o quadro de saúde agravava. “Após uma operação que fez, voltou para casa mais debilitada, sentia fraqueza. Colocamos na cadeira rodas, pois sentia muita dor”.

Religiosa, Val resolveu acampar com o clube de aventureiros da igreja em um final de semana, e foi a partir daí que as coisas desandaram. Márcia passou mal e foi levada para o hospital, pela filha, onde internou.

Val se emociona ao falar da irmã e do filho (Foto: Alana Portela)
Val se emociona ao falar da irmã e do filho (Foto: Alana Portela)

Tragédia - Mais tarde, naquele mesmo dia, Val recebeu uma ligação da sobrinha. Ela sugeriu que se apoiasse em alguém próximo. “Minha sobrinha me ligou perguntando se o nome do meu filho Alexander, fiquei apreensiva. Depois de alguns minutos, ligou novamente, era ela dizendo que o Alex tinha levado um tiro”, contou.

Val entrou em desespero, não conseguia pensar em nada, só queria ver o filho e torcia para tudo não passar de mal entendido. “Liguei para meu marido para ver se estava sabendo de algo, disse que não. Aí recebi outra ligação falando que ele estava na Santa Casa, e o médico disse que já tinha chegado no local sem vida”, disse.

A bala que tirou a vida de Alex atravessou sua cabeça e ele morre instantaneamente. “Meu esposo estava perturbado com a notícia e tentei acalmá-lo”. Já no hospital ficou sabendo que a irmã havia sido internada no Hospital do Câncer. “Ela quis ser internada porque não estava se sentindo bem, estava com muita dor”.

Val ao lado de sua irmã Márcia (Foto: Arquivo pessoal)
Val ao lado de sua irmã Márcia (Foto: Arquivo pessoal)

Justiça com as mãos - Alex morreu após um disparo acidental de arma de fogo enquanto trabalhava na Base Aérea. Na época, fazia vários planos e a morte “prematura” gerou a revolta dos amigos. Contudo, para evitar mais tragédias, Val e seu esposo conversaram com cada amigo do filho e pediu para tirarem a ideia de vingança que estava na cabeça. Para ela, o disparo que levou o filho foi acidental.

“Tive que ir na casa de cada família para dizer que não havia sido daquele jeito, e para não tentarem fazer nada, foi realmente um acidente e a perícia comprovou depois. Meu filho e o outro estavam brincando e acidentalmente houve o disparo. Acredito nisso porque o Alex era brincalhão”.

No dia do enterro do filho, Val recebeu a notícia de que a irmã também havia morrido. “Enterrei meu filho às 10 horas e às 17 horas minha irmã faleceu. Estava deitada acalmando meu marido quando minha mãe entrou em casa chorando, desesperada”, disse.

Ao receber a notícia mais um pesadelo se transformou em realidade. “Havia acabado de enterrar meu filho, não tinha conseguido vê-la no hospital, nesse tempo. Estava no meio desse furacão, comecei tudo de novo, velório, preparação do enterro”, contou.

Com os olhos cheios de lágrimas, Val relata como foi superar as perdas (Foto: Alana Portela)
Com os olhos cheios de lágrimas, Val relata como foi superar as perdas (Foto: Alana Portela)

Superação - Val se apegou à fé para suportar tanta dor emocional. “Se eu caísse muitas pessoas poderiam cair também. Tinha que ser forte porque tenho meus filhos, minha mãe meu esposo e tinha a minha sobrinha”, disse.

Mesmo com as tragédias, Val sempre pensou em seguir em frente, dando continuidade aos planos tanto da irmã, quanto do filho. “Não me fechei em nenhum momento até porque os dois que se foram, eram as pessoas mais alegres da família. A Márcia sofreu, teve muito tempo de hemodiálise, mas nunca ouvimos ela reclamar sempre correndo atrás”, lembrou.

Marcia trabalhou durante muitos anos como voluntárias nos projetos da Recromasul, e queria muito continuar atuando no local. Já o filho Alex fazia planos para o futuro, tinha vontade de terminar o ensino médio e viajar para o Haiti, onde prestaria serviços sociais. Foi esse desejo de ajudar o próximo que motivou Val a continuar.

Atualmente, ela trabalha no Recromasul. “É uma associação que dá apoio aos doentes renais crônicos, pessoas que fazem hemodiálise, temos uma assistência social específica para ajudá-los, um advogado para ajudar na parte de benefícios direitos que eles têm ajudamos também com cestas básicas verduras o que nós conseguimos repassamos para eles”, explica. “É a continuidade do trabalho que queriam”.

Dores - Anos antes, Val já havia enfrentado dois períodos de luto. Isso porque, em outubro de 2016 seu pai Ney morreu de câncer de próstata. No ano seguinte, seu irmão Ramão estava com depressão e tirou a própria vida. As perdas não tiveram um intervalo muito longo, porém, a dor ajudou Valdynéia a seguir em frente.

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Atualmente Val trabalha no Recromasul de Campo Grande (Foto: Alana Portela)
Atualmente Val trabalha no Recromasul de Campo Grande (Foto: Alana Portela)
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