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Comportamento

No voluntariado, ao acolher o próximo, foi Rodrigo quem se viu acolhido

Paula Maciulevicius Brasil | 12/11/2019 07:42
Publicitário e voluntário da Cruz Vermelha, Rodrigo relata a experiência na acolhida aos venezuelanos.
Publicitário e voluntário da Cruz Vermelha, Rodrigo relata a experiência na acolhida aos venezuelanos.

Sete dias entre hermanos irmãos. O Voz da Experiência de hoje é escrito pelo publicitário, coordenador de Comunicação e voluntário da Cruz Vermelha, Rodrigo Motta. Aos 30 anos, ele relata como foi a semana em que acolheu e também foi acolhido por venezuelanos em Campo Grande: 

A experiência de ajuda humanitária daqueles que, ao escolherem acolher o próximo, se viram integralmente acolhidos

Ao final da tarde de terça-feira, 29 de Outubro, todos nós, voluntários da Cruz Vermelha Brasileira Filial Mato Grosso do Sul, recebíamos em nosso grupo institucional no WhatsApp um alerta sobre possível mobilização de acolhida aos refugiados venezuelanos para a manhã do dia seguinte. Este já era o terceiro aviso que a instituição recebia em dois meses a respeito de possíveis voos com imigrantes que pernoitariam na Capital. Porém, um problema de emissão de passagens e disponibilidade de voos, fez com que nós da Cruz Vermelha MS, junto da população de todo Estado, e com o apoio de ONG's e instituições beneficentes, estendêssemos a ajuda humanitária, incessantemente, por uma semana inteira!

A Operação Acolhida, que recebe e promove a interiorização de imigrantes e refugiados venezuelanos no País desde 2017, é a primeira missão humanitária em território nacional das Forças Armadas Brasileiras. Foi através desta operação que Campo Grande pode mostrar para toda população do Estado que a ajuda ao próximo é uma virtude de muitos, pois desde quarta-feira, dia 30, a Seleta Sociedade Caritativa e Humanitária, escolhida como base desta operação, abriu os portões de sua sede diariamente para receber toneladas de alimentos, roupas e materiais de higiene pessoal e limpeza, que chegavam de vários lugares e em todos os turnos. Esta repetida cena foi uma das mais emocionantes que eu vivenciei lá dentro. E foram muitas.

"Somente quando ganhamos seus sorrisos, pudemos prestar o apoio necessário".
"Somente quando ganhamos seus sorrisos, pudemos prestar o apoio necessário".

Desde quando os refugiados desembarcaram na Capital na primeira manhã, o nosso plano de acolhida passou a ser revisado a todo instante. Os cuidados, iniciados com zelo pela triagem de cada membro da família naquele salão, nos permitia entender um pouco de como o outro se encontrava, e assim nos posicionava quanto equipe nas necessidades mais básicas dos refugiados. Da onde estavam vindo? Para onde estavam indo? Quantas crianças estavam com eles? Quantas pessoas de idade? Alguma grávida? Alguém com remédio controlado? Alguém sentindo enjoo? As perguntas que norteavam nossa atenção e apoio psicológico, também foram os primeiros passos para uma aproximação que fez toda diferença em vários momentos de crises que surgiram após abraçarmos a causa. E assim, logo nas primeiras horas, enfrentávamos um sério problema: a diarréia.

Devido às condições climáticas do dia, com temperaturas extremamente altas, somadas à baixa imunidade e ainda em razão da fome daqueles que esperavam horários incertos de ir e vir dentro de um País que recém aprendiam a chamar de "lar", a necessidade de uma resposta para essa crise teve de ser rápida e certeira. Acionar os agentes de saúde do município para que pudessem contribuir com os voluntários de primeiros socorros e de atendimento pré-hospitalar que já estavam entre nós, foi a primeira medida para contornar essa variável. Horas depois, em razão de uma nova informação sobre a operação, a de que precisaríamos estar preparados para abrigá-los por mais dias, nos colocou novamente em outro estado de alerta, desta vez ainda mais urgente. Precisaríamos de novas doações para dar suporte na alimentação, na higiene pessoal e no mínimo de humanidade para que pudessem fazer suas necessidades básicas e ter um cantinho para dormir.

Foi neste momento que a comunicação entre as entidades do terceiro setor de Campo Grande começou, e assim dávamos início a uma rede de apoio institucional que nos deu todo amparo necessário durante os dias subsequentes, não apenas de doação, mas de ampliação do nosso quadro de voluntariado. Uma ação coordenada entre entidades de ajuda humanitária, nos permitiu conhecer pessoas fantásticas e instituições incríveis que transformam diariamente a realidade de muitas pessoas dentro do nosso País e fora dele! A imprensa, que começou a marcar presença desde as primeiras horas de operação, foi essencial para que pudéssemos ampliar o nosso pedido de ajuda para a comunidade. Até que, em poucos dias, passou a ser vista como um obstáculo na visão daqueles que gostariam de ter o pouco de intimidade e dignidade que lhes restavam, respeitadas. E foi um pedido compreendido por todos nós e abraçado por muitos veículos da imprensa.

Imprensa marcou presença para ampliar o pedido de ajuda para a comunidade.
Imprensa marcou presença para ampliar o pedido de ajuda para a comunidade.
Ação coordenada entre entidades de ajuda humanitária nos permitiu conhecer pessoas e instituições incríveis.
Ação coordenada entre entidades de ajuda humanitária nos permitiu conhecer pessoas e instituições incríveis.
"Ser voluntário é a melhor experiência que eu posso ter hoje, e eu não troco isso por nada no mundo!"
"Ser voluntário é a melhor experiência que eu posso ter hoje, e eu não troco isso por nada no mundo!"

Quando me deparei com a vulnerabilidade do outro ser humano, dos medos e receios que carregavam consigo em decorrência à dura realidade da imigração forçada território brasileiro adentro, quando me coloquei frente a frente com a angústia da incerteza daqueles que carregavam no colo a cria, o sangue, a responsabilidade de lidar não só com sua própria dor, mas com a dor de seus filhos e entes queridos... Ainda que cheio das responsabilidades do que o voluntariado me colocava nos ombros, vi meu sono, minha fome e minhas dores postas de lado, e com a entrega mútua dos que escolheram acolher, me misturei aos acolhidos. Em determinado momento, e com o passar dos dias, consegui compreender a essência mista da empatia e do egoísmo que se multiplicava por muitos de nós voluntários que vestíamos os coletes da Cruz Vermelha Brasileira durante os dias que permanecemos na operação, a de que fugíamos da nossa realidade, pra termos a chance de nos encontrar na do outro - e ali sermos todos reconhecidos entre si, voluntários e refugiados, como "hermanos irmãos".

Somente quando ganhamos seus sorrisos, suas histórias e anseios... Quando nos permitiram adentrar no campo da intimidade de suas experiências e das experiências dos seus familiares... É que pudemos, então, prestar todo apoio psicossocial necessário para acalmar os ânimos mais aflorados daqueles que - impacientes por novidades sobre uma data oficial no qual deixariam Capital e seguiriam rumo ao destino final de seus processos de interiorização pelo País, precisavam de amparo e atenção. Da nossa devoção em serviços de triagem de roupas e alimentos, das tarefas de limpeza, cozinha e comunicação, também iniciamos as atividades de entretenimento, levando brincadeiras e dinâmicas para as crianças e adolescentes presentes na acolhida, assim como a dos adultos. Tivemos cama-elástica, futebol de sabão, guerra de bexiga, contação de história, dança, teatro, música, oração... Tivemos tudo aquilo que o ser humano precisa de mais essencial para se sentir vivo... O amor do próximo.

E foi esse amor ao próximo que nos permitiu passar por cima das dificuldades com êxito e cumprir nosso objetivo com primor, o de embarcar essas famílias, que nas despedidas do ônibus até o aeroporto para seus destinos finais, nos encheu os olhos de lágrimas, saudades e vontade de reencontros. Participar desta acolhida me deu a oportunidade de me sentir vivo, de me sentir útil. Me deu a chance de fazer novos amigos, de conhecer aqueles que promovem o trabalho no bem, na ajuda ao próximo. Me possibilitou criar laços que eu vou carregar pra sempre dentro de mim. Participar de uma operação de ajuda humanitária me fez compreender que meu coração, ainda que batendo dentro do meu peito, pulsa pelo outro.

Ser voluntário é a melhor experiência que eu posso ter hoje, e eu não troco isso por nada no mundo!

Rodrigo Motta, Voluntário da Cruz Vermelha Brasileira e apaixonado pelo ser humano.

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