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Comportamento

Tapeceiro ficou cego há 8 anos, mas reagiu e agora quer ser repórter de TV

Elverson Cardozo | 20/05/2014 06:51
Acadêmico edita os próprios áudios. (Foto: Cleber Gellio)
Acadêmico edita os próprios áudios. (Foto: Cleber Gellio)

Descolamento de retina e o socorro tardio fizeram com que João Guanes, 46, perdesse a visão aos 38 anos. O período de luto e a não aceitação foi inevitável, mas a vontade de viver do então tapeceiro, pai e esposo, corumbaense radicado em Campo Grande, se mostrou maior.

Seis anos e meio depois, já readaptado ao convívio social, ele decidiu encarar mais um desafio. Entrou para o curso de jornalismo e hoje, no terceiro semestre da graduação, mais determinado que nunca, anuncia, para quem perguntar, que pretende ser repórter de televisão e se dedicar às coberturas políticas.

“Para quem não enxerga também não é fácil e eu sei que, para mim que sou deficiente visual, é mais difícil. Não vai ser fácil, mas gosto de transpor barreiras, de conquistar. Vejo como uma oportunidade para mostrar minha capacidade e coragem de lutar”, disse.

Guanes ficou longe da escola por 24 anos. Quando ficou cego, tinha apenas o Ensino Fundamental completo, mas, diante da nova realidade, ele achou forças para voltar a estudar.

Em 2010, fez o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Ganhou bolsa do Prouni (Programa Universidade Para Todos), mas perdeu o benefício porque estava devendo uma matéria do último ano. Em 2011, realizou, de novo, a prova nacional, mas não alcançou pontuação necessária para concorrer. O jeito foi partir para o FIES (Fundo de Financiamento Estudantil) em uma universidade particular.

Pensou, no início, em fazer Rádio e TV, mas o curso já não era mais ofertado. Decidiu, então, entrar para a turma de jornalismo. Antes de se tornar estudante de comunicação social, a única visão que João tinha da futura profissão se limitava aos programas dominicais, como o Fantástico, da Rede Globo, e à imagem do apresentador formal, de terno e gravata, por trás da bancada.

Sem nenhum parente jornalista na família, ele relata que sempre se identificou com o ofício. “Quando enxergava, eu gostava muito de trabalhar com vendas. Fiz cursos nessa área. E, como tapeceiro, eu gostava de estar envolvido com as pessoas”, relaciona.

Hoje, mais inteirado do assunto, ele sabe que a formação abrange várias atividades e que, por isso, pode atuar em vários ramos.

Primeira experiência - Embora o sonho seja trabalhar em uma emissora de TV, o estágio, primeiro contato dele com a prática do jornalismo, está sendo no Ismac (Instituto Sul Mato-grossense para Cegos Florisvaldo), onde se reabilitou.

João perdeu a visão há 8 anos. (Foto: Cleber Gellio)
João perdeu a visão há 8 anos. (Foto: Cleber Gellio)

Na instituição, que oferece atendimento gratuito para deficientes visuais e pessoas com baixa visão, o acadêmico é repórter de uma rádio web, criada a partir de um projeto desenvolvido pela Petrobras. É ele quem entrevista e edita o próprio material.

Dia desses cobriu um jogo de futebol só para cegos. Não narrou, claro, mas registrou o evento e entrevistou participantes. Contou com a ajuda de uma “moça que enxergava”, mas o trabalho dela se resumiu a dar algumas orientações guiá-lo até o entrevistado. A finalização, no entanto, ficou a cargo dele.

É assim que João pretende trabalhar, respeitando o próprio limite. O acadêmico acha difícil, inviável, cobrir, por exemplo, uma manifestação popular, cenário que exige, de fato, atenção e memória fotográfica, mas diz que pode muito bem fazer uma matéria sobre agricultura que, geralmente, é algo mais planejado. “Para mim, não existe nada impossível, mas aos olhos das outras pessoas é tudo novidade”, afirmou.

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