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Em Campo Grande, usina abandonada é destino com trilha, escalada e travessia

Paula Maciulevicius | 11/01/2016 06:12
Vista quando se chega à última cachoeira, do Ceroula. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Vista quando se chega à última cachoeira, do Ceroula. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)

São ruínas e o resto de um maquinário que alimentou a cidade. História abandonada é o destino da trilha de cinco quilômetros que o Lado B percorreu nesse domingo, na estrada que dá acesso à região do Inferninho, saída para Rochedo. Construída na década de 1920, a primeira usina hidrelétrica alimentou por quase 50 anos uma Campo Grande que ficou no papel. Para chegar até lá, é preciso disposição mesmo com o aviso de que, chuva e frio fazem parte da natureza e que o evento não é cancelado devido a fatores climáticos. Choveu o dia todo e acredite, para quem está numa trilha, a água tem outro peso.

Organizado pela Sopa de Pedra, agência de turismo de aventura especializada em roteiros de final de semana, o passeio era um hiking, caminhada pela natureza de poucas horas e que não inclui pernoite, por três cachoeiras até a hidrelétrica. O trajeto já é um velho conhecido do guia e fundador do Sopa, Nilson Young, mas realizado em passeios desde junho do ano passado.

A caminhada de aventura é considerada de nível médio. Isso, só me caiu a ficha depois. Por conta da inclinação do terreno, dificuldade e tempo. O roteiro inclui três cachoeiras: da Pontezinha, do Céuzinho e do Ceroula, numa mata fechada e com acesso dificultado, onde os obstáculos naturais são: o próprio trajeto, as pedras e a lama formada por conta da chuva.

Trajeto inicia na estrada que dá acesso ao Inferninho. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Trajeto inicia na estrada que dá acesso ao Inferninho. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Trilha também tem travessia por corda em meio à água. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Trilha também tem travessia por corda em meio à água. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)

À primeira vista, os olhos encontram com a cachoeira da Pontezinha, onde a ponte em si, já não existe mais. Depois se enxerga a cachoeira do Céuzinho, vista muito mais bonita de baixo. O que exige uma descida "daquelas". O passeio é acompanhado por três guias. O grupo em que estávamos tinha 20 pessoas, contando os profissionais.

Eles alertam para o silêncio que se deve ter ao passar por um ponto onde as abelhas Arapuá fazem moradia, ou ainda entre as pedras onde uma jiboia já vista anteriormente reside. Do Céuzinho, segue adiante, com bastão em mãos e passos curtos e de lado até a próxima cachoeira.

Os quilômetros adiante têm duas travessias pelo córrego. Com a corda sendo segurada de um lado, o aventureiro segue com tudo para dentro d'água. Quem se beneficiou da altura, pouco se molha. Baixinhos chegam a sentir a água na cintura. Foi aí que entendi a orientação por roupas leves, de preferência em dry, que secam rápido e mantém a temperatura do corpo. É fundamental que celulares, câmeras e documentos também estejam envoltos em plásticos e nem precisa dizer que água e lanchinhos são mais que necessários.

Ruínas da usina abandonada desde a década de 70.(Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Ruínas da usina abandonada desde a década de 70.(Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
O que ficou das paredes escondem o maquinário abandonado. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
O que ficou das paredes escondem o maquinário abandonado. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Usina do então sul do MT foi feita de maquinário de 2ª mão. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Usina do então sul do MT foi feita de maquinário de 2ª mão. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Por dentro, o que ficou do maquinário foi tomado por um belo verde. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Por dentro, o que ficou do maquinário foi tomado por um belo verde. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Parada para fotos e contemplação do verde que tomou conta do passado. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Parada para fotos e contemplação do verde que tomou conta do passado. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)

O que ficou das paredes escondem o maquinário abandonado, a Usina do Ceroula, nome do córrego que despeja águas para bacia do Rio Aquidauana e por consequência, do Paraguai, feita ainda quando o estado era um só e coordenada pela Centrais Elétricas de Mato Grosso.

A construção foi tocada pelo sócio majoritário das Centrais, engenheiro Cincinato Sales de Abreu, em 1920 e concluída em 1923, segundo a tese de pós-graduação em energia "A formação do setor energético de Mato Grosso do Sul: uma análise à luz da teoria do desenvolvimento de Celso Furtado", de Hélvio Rech.

A primeira hidrelétrica do então sul do Mato Grosso foi feita a partir de maquinário de segunda mão, trazido do interior de São Paulo, onde se aproveitava a queda d'água de 70m, de onde se pode ver a tubulação até hoje. À época a região do Inferninho era fazenda de Vespasiano Martins. De lá, a energia era levada até a sede da usina, na esquina das ruas Cândido Mariano e Calógeras, de onde era distribuída. A história conta que eram pouco mais de 8 mil habitantes em Campo Grande. O funcionamento dela seguiu até o início da década de 1970, onde a Ceroula dividia a função de abastecer uma cidade já grande, com outras duas usinas: de Botas e posteriormente, do Mimoso.

Parada para fotos e contemplação do verde que tomou conta do passado, é hora de voltar. A trilha não é a mesma da vinda. A prova está na "escalaminhada" que surpreende aventureiros de primeira viagem. A subida íngreme exige mãos na corda e pés nas raízes ou pedras que existirem pelo caminho. Um dos pontos de maior adrenalina - leia-se de mais medo do trajeto.

Segunda cachoeira, do Céuzinho. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Segunda cachoeira, do Céuzinho. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Loraine, advogada que sente a endorfina pelo corpo depois do hiking. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Loraine, advogada que sente a endorfina pelo corpo depois do hiking. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Carla fazendo a escalaminhada. Corda nas mãos para subir trajeto. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
Carla fazendo a escalaminhada. Corda nas mãos para subir trajeto. (Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)

A solidariedade está na essência de quem se aventura. Não precisa nem chegar a cair, basta um escorregão, para que mãos amigas te coloquem de volta à posição.

Praticante nova ou já experiente, a sensação do hiking pode ser resumida na descrição de Loraine Fernandes, de 36 anos. Advogada, já familiarizadas com trilhas, em especial de pedal, ela se sente "endorfinada", ao chegar na reta final.

"Achei desafiador, tinha bastante coisa diferente do que normalmente eu faço. Ver o volume de água da última cachoeira, me surpreendeu. Tão perto. O que se sente depois é isso: endorfinada. Porque eu gosto de fazer exercício, atividade física e ver coisa diferente te dá essa sensação", narra.

Para Carla Bardella, bancária, de 38 anos, apesar de parte do roteiro já ter sido feito em corridas, ainda haviam trechos inéditos. "É uma inspiração, uma renovação, mesmo cansada", diz. A chuva pesou trazendo também um pouco de frio, mas nem isso foi suficiente para ela se desanimar ou desestimular alguém.

"O que eu diria? Se joga. O novo te dá um pouco de medo, mas quando você encara se pergunta: por que não fiz isso antes?"

A proposta de se aventurar no novo e naquele que se conhece apenas por teoria era a intenção da estudante de Turismo Amanda Maciel Assis, de 21 anos. "Uma das motivações para se fazer o turismo de aventura é testar a capacidade e o limite de cada um. Com certeza ultrapassei os meus, pelas aventuras, pelo declive do solo, chuva, lama. Foi um dia de superação", define. 

A Sopa de Pedra tem um calendário extenso de atividades assim, inclusive duas datas que já não têm mais vagas em janeiro. Na programação, há também o curso de Trekking, caminhada que inclui pernoite, em Piraputanga, com o montanhista Tiago Borges.

Para a aventura, o guia do Sopa de Pedra resume que a primeira condição exigida é ter vontade. "A caminhada na natureza é muito prática e democrática. Todos podem participar", diz Nilson Young. Claro que com as visitas médicas em dia e com cuidados e acompanhamento de guias. Acompanhe aqui as atividades pela página do Facebook.

"Além de nos levar a lugares, uma trilha sempre nos leva a alguém", resume Nilson. 

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Para o conteúdo dessa reportagem, o Lado B contou com o apoio do amigo e historiador Edson Contar.

(Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
(Foto: Nilson Young/Sopa de Pedra)
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