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MP de bondades pode conter armadilhas

Por Reginaldo Gonçalves (*) | 19/07/2014 13:22

Ante a tão esperada Medida Provisória 651, publicada no Diário Oficial da União em 10 de julho, com alguns benefícios, cujo objetivo é estimular a produção industrial por meio da redução de impostos e contribuições, além de incentivar a busca por financiamento mais barato, é importante entender o alcance, riscos e consequências desse pequeno pacote de bondades. Analisemos cada uma das decisões adotadas.

1) Substituição da Contribuição Patronal pela Contribuição sobre o Faturamento que era provisória e acaba sendo permanente, envolvendo 56 setores. Ênfase para a possibilidade de que alguns segmentos tenham os reflexos positivos anulados, em decorrência do aumento da arrecadação por uma taxa fixa sobre o faturamento. Quanto mais faturar, mais paga, independentemente do número de funcionários. Existem críticas do Ministério da Fazenda com relação a sua renúncia fiscal, que estima ser de R$ 23,8 bilhões em 2015.

2) Adesão ao Refis, estabelecendo-se um parcelamento com redução de multa e juros. Por um lado, isso beneficia o governo, que recupera o seu crédito no mercado. Por outro, é bom para o inadimplente que, por motivos diversos, deixou de recolher os seus impostos. A grande discussão era com relação à parte do pagamento inicial para formalização do parcelamento, que foi reduzida nessa MP da seguinte forma: dívidas consolidadas de até R$ 1 milhão - pagamento de 5%; dívidas até 10 milhões - pagamento de 10%; dívidas até 20 milhões - pagamento de 15% etc. A consolidação dos débitos e o aproveitamento dos benefícios da MP somente valerão para as dívidas vencidas até 31 de dezembro de 2013. Através desse procedimento, o governo, no final do ano, poderá fechar suas contas, estimadas em R$ 15 bilhões.

3) Retorno do Reintegra, que beneficiará as empresas exportadoras pela venda de produtos manufaturados feitos fora do Brasil, através do crédito PIS/COFINS. Embora o texto da Lei fale em variação entre 0,1% e 3%, o percentual deste ano será de 0,3%.

4) Incentivo às pequenas e médias empresas, tornando isento o ganho de capital na alienação de ações emitidas dentro do programa. Para ter acesso ao programa, a empresa tem de ter um valor de mercado de R$ 700 milhões e receita de R$ 500 milhões no exercício anterior. O grande problema está no valor total do negócio. Muitas pequenas empresas têm seu faturamento muito inferior aos montantes listados. Isso, somado aos custos da manutenção no mercado de capitais e às exigências de publicação, auditoria e da transparência, acaba inviabilizando o processo. Os valores listados são para empresas de médio a grande porte. Neste caso, a medida não beneficiará a redução de custos financeiros da maior parte. A MP coloca um prazo de benefício fiscal até 31 de dezembro de 2023, mas poucas efetivamente aderirão. Os custos financeiros do BNDES acabam sendo muito mais atrativos.

5) Debêntures de Infraestrutura foram isentas de Imposto de Renda até 2020. O propósito é atender aos seguintes segmentos: Petróleo e Gás, Rodovias, Energia, Ferrovias, Aeroportos, incluindo as áreas de Educação, Saúde, Hídrica, Irrigação e Ambiental. A proposta é de um financiamento de longo prazo, considerando projetos com período médio de execução de quatro anos. É uma alternativa que pode fomentar o setor e talvez mais barata do que o próprio mercado de capitais. Porém, o benefício é para empresas que possuem transparência e controle contábil de suas operações.

6) Fundos de Investimento - ETF Renda Fixa que passam a ser negociados em bolsa com alíquotas diferenciais, dependendo do prazo de aplicação: prazo de 180 dias - 25%; até 720 dias - 20%; e acima de 720 dias, 15%. Esse mecanismo de negociação e valorização na Bolsa é permitido para os Fundos de Investimentos Imobiliário. Os ETF´s são Fundos baseados em índices e que são negociados como se fossem ações.

A MP foi editada num momento em que as empresas estão necessitando de recursos para sua sobrevivência, já que, infelizmente, a cada mês as indústrias vêm passando por dificuldades em manter seu faturamento, encolhendo sua estrutura, havendo o risco de desemprego em massa. Nesse contexto, a iniciativa tem cunho político, para tentar resgatar e melhorar a performance das empresas. O que se nota diante de vários pontos relacionados a incentivos nas diversas áreas é que não há uma estrutura que permita vislumbrar o longo prazo. As medidas visam, sim, melhorar no presente e capitalizar o governo de recursos para fechar as contas em ano político. No entanto, são estrategicamente falhas porque não vislumbram o longo prazo. A desoneração da folha, que o Ministério da Fazenda alega representar uma redução da arrecadação em virtude da substituição do fato gerados para as empresas que foram, entre aspas, beneficiadas pela desoneração em alguns segmentos na realidade, poderá apresentar aumento da carga tributária. A busca por parcelamento incentivado somente vem demonstrando que a carga tributária está elevada e que o produto perdeu competitividade. Compensa mais importar e vender no mercado interno do que produzir. As exportações transformaram-se em um fiasco. Somente se percebe que a área agrícola está a plena carga, mas que outros produtos exportáveis estão sofrendo restrições em preços.

A abertura de capital para a pequena e média empresa é outro fator a ser regulamentado de modo mais prudente. A questão de busca de sócios para negócios sem estrutura pode levar a empresa a não conseguir recursos para manter os custos administrativos e de prestação de contas.

Medidas dessa natureza, lamentavelmente, não apresentam alternativas no curto, médio e longo prazos. A falta de confiança do brasileiro é evidente. Faz-se necessária a recuperação da credibilidade, com redução dos gastos públicos, melhor gestão dos preços administrados e o corte de manobras contábeis para melhorar indicadores. Falta muito ainda para minimizar o impacto inflacionário e para impedir-se um processo de estagflação (estagnação com processo inflacionário). Já ultrapassamos o teto máximo anual de 6,5% em junho. A redução do crescimento do PIB é evidente, podendo chegar a menos de 1%. Já se discute 0,7%, e as agências de risco sinalizam que precisa haver controle no gasto público, o que fica difícil em ano de eleição, devido ao uso da máquina administrativa.

(*) Reginaldo Gonçalves é coordenador do curso de graduação de Ciências Contábeis da Faculdade Santa Marcelina – FASM.

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