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Cidades

Depois de formatura antecipada, desafio é virar médico em plena pandemia

Acadêmicos de Medicina da UFGD e da UFMS em Três Lagoas anteciparam a colação de grau, que foi online ou até dentro do carro

Lucia Morel | 07/05/2020 18:00
Amanda, que quer ser dermatologista, está no alto, à esquerda. (Foto: Reprodução)
Amanda, que quer ser dermatologista, está no alto, à esquerda. (Foto: Reprodução)

Amanda Barbosa Dias Melo, de 25 anos, esta entre os primeiros 74 recém-formados de Mato Grosso do Sul  que tiveram a colação de grau antecipada por conta da covid-19. Ela sempre pensou na especialização em Dermatologia, mas a vida profissional dela e dos colegas agora exige algo inimaginável até pouco tempo, começar já na linha de frente do combate a uma pandemia.

A Dermatologia vai ter de esperar, antes disso, Amanda quer atuar em algum posto de saúde, seja em Dourados, ou em sua cidade natal, Três Lagoas, onde o novo coronavírus já fez três vítimas. “Antes da pandemia eu já queria trabalhar em posto, mas agora que começou a aumentar a transmissão, acho que vai aumentar a demanda por médicos também, mais hospitais precisando”, avalia.

Outro plano que teve de mudar foi a comemoração após anos intensos de formação. O sonho de participar de uma festa de formatura, com a família presente, inclusive na colação, vai ter de ficar para depois. Desta vez, a colocação foi por vídeo conferência.  “Mas nesse momento não tinha como e pra mim, fiquei muito feliz de qualquer forma, porque concretizei um sonho”, disse.

Graduada pela UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) , Amanda diz que medo tem bastante, "porque ninguém está imune ao vírus”, sustenta. Mas pondera, afirmando que ao escolher ser médica, já previa passar por situações semelhantes. “A gente já se forma sabendo que vão precisar da gente em situações como essa”, sustenta.

“Minha família me apoia bastante e tenho mais familiares que são profissionais da saúde, então minha família já está preparada emocionalmente. Meus pais estão tranquilos e sabem que eu preciso trabalhar e ajudar nesse momento”, comenta.

As duas universidades federais do Estado, UFGD e UFMS, em Três Lagoas, anteciparam a colação de grau de estudantes de Medicina, baseando-se em autorização do MEC (Ministério da Educação). Ao todo, 38 acadêmicos em Dourados e 36 em Três Lagoas conseguiram se formar antes do tempo.

Melissa Rubinstein, 28 anos, também se formou na UFGD, mas é daqui de Campo Grande, onde pretende começar a trabalhar. Apesar do medo, ela diz que se sente preparada para atuar no momento de pandemia, ainda que deseje “ir aos poucos”.

Melissa assinou o certificado dentro do carro. (Foto: Arquivo Pessoal)
Melissa assinou o certificado dentro do carro. (Foto: Arquivo Pessoal)

Ela afirma que assim que tirar o registro no CRM/MS (Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul), vai procurar a prefeitura e verificar as vagas disponíveis e, se tudo der certo, quer começar a atuar em situações menos críticas, onde vai conseguir ganhar experiência e segurança.

“Sempre tem temor. Se eu tivesse me formado fora de uma pandemia, ia ter temor normal de um recém formado e sei que experiência é algo que conta muito. E esse temor, nesse período de pandemia, piora”, avalia.

A médica recém formada diz ainda que apesar de querer pegar casos menos graves, sabe que vai encontrar desafios grandes diante do combate à doença e afirma que “quero ajudar sim, quero assumir essa responsabilidade”.

Sobre sua família, ela conta que seus pais estão temerosos em saber que ela vai começar a trabalhar nesse período. “Eles concordam que não devo encarar logo procedimentos mais difíceis, mas sabem que se essa é a profissão que escolhi, tenho que assumir a responsabilidade”

Roque, no centro, abaixo, também fez juramento virtual junto com seus colegas. (Foto: Reprodução)
Roque, no centro, abaixo, também fez juramento virtual junto com seus colegas. (Foto: Reprodução)

Quem também espera só o registro profissional para começar a trabalhar na linha de frente da covid-19 é Roque Beltrão Batista, 25 anos. De Anastácio, ele se formou em Dourados, onde pretende começar a atuar.

No entanto, diz estar com “pouco medo”, até porque no município, a doença parece estar controlada, mas assume que pode ser porque “ainda não caiu a ficha”. “Eu tenho um pequeno temor de ter que já ir pra linha de frente, mas acho que pode ser porque ainda não caiu a ficha pra todo mundo (de que a situação pode se agravar)”, avalia.

Para ele, em Dourados assim como no restante do Estado, os casos devem aumentar quando os locais que são os atuais picos da doença – São Paulo, Amazonas e Maranhão – apresentarem queda nas notificações.

“Eu acho é de que vai aumentar aqui quando São Paulo e outras cidades em pico diminuírem o número de casos, mas nada que fuja do controle. Não estou com medo”, afirma.

Sobre a expectativa da família sobre sua profissão, ele diz que também não está temerosa, até porque seus pais estão em Anastácio, onde ele nasceu e lá, a doença ainda não apareceu.

“Não estão chocados nem espantados porque em Anastácio há menos casos ainda que aqui e de certa maneira, lá, eles até menosprezam o tamanho real do problema. Mas o sentimento é que foi pra isso que eu estudei e me apoiam no que eu decidir”, comenta.

Ele conta que vai ficar em Dourados e “já estou falando com os responsáveis dos hospitais, das UPAs. Colegas que já trabalham falam que está precisando bastante de médicos por causa da covid-19”.

Formandos de Medicina em Três Lagoas. (Foto: Bruno Oliveira/divulgação)
Formandos de Medicina em Três Lagoas. (Foto: Bruno Oliveira/divulgação)

Três Lagoas - Cristiane Bergo Domingues, 38 anos é de Ribas do Rio Pardo e junto a outros colegas, formou-se antes do tempo pela UFMS. Para ela, temor também é palavra real diante do momento em que ela vai começar a atuar, mas também lembra de responsabilidade.

“A formatura em si já gera uma expectativa grande e tornar-se médico no meio da situação de saúde que estamos vivendo, é uma responsabilidade muito maior”, fala.

Sobre o medo, avalia que todo médico deve ter medo de ser contaminado ao atuar na profissão, não apenas pela covid-19, mas por qualquer outra doença infecto-contagiosa. Mas ela diz que “não podemos deixar que isso impeça de fazer o trabalho, que é cuidar do paciente, porque é para isso que a gente estuda e aprendemos a tomar as medidas de segurança necessárias”.

Cristiane aguarda CRM para começar a trabalhar. (Foto: Arquivo Pessoal)
Cristiane aguarda CRM para começar a trabalhar. (Foto: Arquivo Pessoal)

Ela também aguarda o registro profissional para começar a atuar.

Seu colega de sala, José Eduardo Itoh Nascimento, 27 anos, diz que seu maior medo diante de começar a trabalhar em meio à pandemia não é ter que cuidar das pessoas doentes, mas levar a doença para casa.

"Meu medo é passar para os mais vulneráveis do meu convívio, como avô e avó, as crianças, que são quem demandam mais cuidado", disse.

Natural de Ivaiporã (PR), ele já voltou para lá, onde pretende começar a atuar. "A pressão é grande nesse momento, porque vamos lidar com muitas pessoas, mas principalmente, podemos enfrentar um número diminuído de leitos e muitos pacientes. Acho que essa é a maior pressão. Você querer dar seu melhor e não conseguir", sustentou.

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