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Cidades

Só família poderia salvar pessoas com transtorno mental que estão em presídio

Nos presídios, 27 pessoas julgadas e consideradas inimputáveis seguem presas

Caroline Maldonado | 30/06/2021 14:30
Nos estabelecimentos penais de Campo Grande, pelo menos 27 pessoas precisam de familiares ou residência terapêutica para ganhar liberdade (Foto: Marcos Maluf)
Nos estabelecimentos penais de Campo Grande, pelo menos 27 pessoas precisam de familiares ou residência terapêutica para ganhar liberdade (Foto: Marcos Maluf)

Em tempos em que ansiedade e depressão são comuns, muita gente busca ajuda para não pirar, mas, agora, imagine a vida de uma pessoa que tem uma disfunção que afeta o comportamento, o raciocínio, o aprendizado e a forma de se comunicar. É muita coisa, mas, mesmo assim, tudo isso passa despercebido por anos até que a vítima vira réu ao cometer um crime motivado pelo transtorno mental.

Nos estabelecimentos penais de Campo Grande, pelo menos 27 pessoas foram julgadas e consideradas impossíveis de assumirem culpa, mesmo assim seguem em uma ala do presídio.

Depois que são julgadas inimputáveis, não importam mais quais foram seus crimes, pois elas recebem um outro olhar, aquele que por anos e anos não receberam da sociedade e, por vezes, nem da família: um olhar para seu transtorno mental.

O olhar que poderia ter evitado o conflito com a lei, agora não pode apagar o que aconteceu, mas é uma luz no fim do túnel para alguém que teve essa infelicidade na vida. A equipe que trabalha para fazer com que essas pessoas voltem ao convívio social em liberdade prefere não falar em crimes, porque essa não é sua função, mas só para se ter uma ideia: nesse rol de presos inimputáveis tem até gente com retardo mental que, sem saber que isso era crime, roubou telhas, motivado por alguém que abusou de seu retardo.

Não é fácil o trabalho da EAP, que é a Equipe de Avaliação e Acompanhamento das Medidas Terapêuticas Aplicáveis às Pessoas com Transtorno Mental em Conflito com a Lei. Eles se emocionam ao relatar alguns casos de pessoas que já passaram por ali e hoje levam uma vida melhor e também aqueles que não tiveram final feliz, apesar dos esforços de toda uma equipe. É que o trabalho esbarra na falta de investimento para que se tenham residências terapêuticas suficientes para quem “não tem família”. Apenas uma funciona hoje na Capital, habilitada para receber os pacientes com transtorno.

Para resumir e ficar fácil de entender, ter um parente interessado em ajudar é a pontuação decisiva para um paciente desse avance no score e consiga sair do presídio. Sem isso fica muito difícil passar por essa porta, mesmo não sendo um “condenado” aos olhos da Justiça e mesmo já recebendo atendimento e medicação adequada, explica a gestora da EAP, Margarete Gaban.

Gestora da EAP, Margarete Gaban, explica o esforso diário da equipe para conseguir que os pacientes voltem para a vida em sociedade fora das instituições penais (Foto: Marcos Maluf)
Gestora da EAP, Margarete Gaban, explica o esforso diário da equipe para conseguir que os pacientes voltem para a vida em sociedade fora das instituições penais (Foto: Marcos Maluf)

“Temos oito pacientes já com liberação condicional, mas ainda no estabelecimento penal por não ter residência; outros cinco que podem progredir assim que nós conseguimos vaga em algum lugar ou família e 14 pacientes que esperam definição para reinserção no convívio familiar e social e, basicamente, esperam um lugar de residência. Eles já são acompanhados pela EAP, já avaliamos o processo, rastreamos familiares e viabilizamos perícia. Em resumo, todos recebem atendimento, mas não conseguimos desinstitucionalizar ainda porque eles não têm onde morar”, conta Margarete.

No total, a equipe atende 128 pacientes em medida de segurança. A EAP de Campo Grande é uma das 11 que existem no Brasil. A maioria dos Estados do país nem têm esse serviço. Na equipe, a enfermeira Alexandra de Cassia Rosa, explica que as pessoas com transtorno mental, muitas vezes, poderiam não ter cometido crime, se recebessem atenção psicossocial a que têm direito. "Infelizmente, às vezes, vemos crianças em que é notório algum transtorno e perguntamos à mãe e ela diz que não tem nada, porque ela nem imagina que tenha um transtorno”, comenta. 

Para Margarete, o que leva a casos como desses de pacientes que acabam cometendo delitos, é o abandono social. “São pessoas que não tiveram seus direitos garantidos e não receberam atenção. Para se ter uma ideia, há pessoas que não têm sequer um RG e vivem uma exclusão social e econômica”, destaca Margarete. 

Equipe tem enfermeira, psicólogo, assistente social, psiquiatra e pedagogo (Foto: Marcos Maluf)
Equipe tem enfermeira, psicólogo, assistente social, psiquiatra e pedagogo (Foto: Marcos Maluf)

Atendimento Gratuito - Quem passa por qualquer situação de dor emocional ou quer ajudar um parente pode procurar os Caps, que são Centros de Atenção Psicossocial. Clique aqui para ver a lista de endereços, em Campo Grande. As UBSs e UPAs também atendem, basta dizer ao clínico geral que precisa de um atendimento de saúde mental para tratar na própria unidade ou ser encaminhado a um Caps. Nos municípios do interior, também os Postos de Saúde podem atender e dar orientações de como ter acesso a um tratamento especializado para se ter uma vida melhor.

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