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Capital

Superlotação, falta de material e drama de pacientes são rotina em hospitais

Insegurança e deficiências no atendimento em postos de saúde da Capital e do interior provocam superlotação na rede hospitalar.

Anahi Gurgel | 07/04/2017 09:37
Em trabalho de parto, Josineide aguarda vez para dar à luz.  "Ficar aqui é constrangedor". (Foto: Anahi Gurgel)
Em trabalho de parto, Josineide aguarda vez para dar à luz. "Ficar aqui é constrangedor". (Foto: Anahi Gurgel)

A falta de leitos e de estrutura básica em três das mais importantes unidades hospitalares de Mato Grosso do Sul mostram que a saúde pública parece mesmo estar jogada às traças. Enquanto gestores discutem em gabinetes formas de melhorar a desordem no setor, pacientes vivem dramas nos corredores à espera de internação ou, pelo menos, de um atendimento digno.

Entre pacientes e familiares, é senso comum que a péssima qualidade – e muitas vezes ausência – de atendimento nas unidades de saúde da Capital e do interior os levam a procurar os centros hospitalares. Mesmo que isso custe uma dura penitência por esperar dias em internações improvisadas, como acontece nos hospitais Regional e Universitário e na Santa Casa de Campo Grande. 

Ironicamente, na véspera do Dia Mundial da Saúde, celebrado em 7 de abril, logo na entrada do PAM (Pronto Atendimento Médico) do Hospital Universitário, por exemplo, foi possível observar, na tarde desta quinta-feira (6), as dezenas de macas em toda a extensão de seus corredores. 

Neles, três gestantes aguardavam vaga para dar à luz. À espera do sexto filho, a dona de casa Josineide Lopes da Silva, 30, estava com a bolsa rompida, em trabalho de parto, e ansiosa na maca do corredor desde às 10h.

“É constrangedor ficar aqui. Deveria ser um momento de tranquilidade, mas estou nervosa. Quando eles vêm me examinar ou fazer algum procedimento, todo mundo fica olhando”, contou.

Virando o corredor, uma jovem de 17 anos e Ana Cláudia Barbosa, 20, seriam as próximas mamães a serem atendidas, mas sem horário previsto.

O HU possui 240 leitos no total, sendo 26 no pronto atendimento. Com a falta de leitos, pacientes graves são internados mesmo quando não há vagas. Na área de internação para adultos, que tem apenas três leitos disponíveis, 22 pessoas estavam "internadas" nos corredores.

Gestantes aguardam vaga desocupar para conseguirem fazer o parto no Hospital Universitário. (Foto: Anahi Gurgel)
Gestantes aguardam vaga desocupar para conseguirem fazer o parto no Hospital Universitário. (Foto: Anahi Gurgel)

Por meio da assessoria de imprensa, a direção do HU informou que muitos pacientes são encaminhados fora do sistema de regulação de vagas, pois procuram o hospital sem passar por unidades de atendimento da rede municipal da Capital e do interior, o que causa a superlotação.

O cenário lamentável do hospital foi evidenciado com o cancelamento, ontem, de todas as cirurgias eletivas e de urgência, e suspensão de novos atendimentos no PAM e na maternidade. O motivo? Falta de compressas cirúrgicas.

No Hospital Regional, à primeira vista, tudo parece tranquilo na recepção do pronto atendimento. A reportagem não foi autorizada a fotografar nem entrevistar pacientes na área de internação, mas relatos expõem a aflição do lado de dentro. 

"Meu marido veio no domingo por causa de dor no estômago, mas não tinha vaga nem maca e ele ficou dois dias numa cadeira. Não tinha nem suporte para o soro, eu que fiquei segurando", lembra Juliana Golpian, 23, operadora de caixa. 

Formulário indicando superlotação no Hospital Regional nesta quinta-feira (06). Foto: Anahi Gurgel
Formulário indicando superlotação no Hospital Regional nesta quinta-feira (06). Foto: Anahi Gurgel
Recepção do pronto-atendimento do Regional nesta quinta (06). Tranquilidade relativa. (Foto: Anahi Gurgel)
Recepção do pronto-atendimento do Regional nesta quinta (06). Tranquilidade relativa. (Foto: Anahi Gurgel)

A unidade, considerada de alta complexidade, possui 400 leitos, sendo 93 para atendimentos de urgência e emergência, onde são realizados em torno de 9 mil atendimentos por mês. Nesta quinta, havia superlotação em praticamente todas as alas.

A assessoria do hospital informou que não seria possível realizar entrevista com gestores na ocasião. O Campo Grande News tentou contato com o diretor-presidente, Justiniano Vavas, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria.

Melhor assim do que nada – Durante a espera por uma vaga de internação, que pode ser muito longa e cheia de percalços, pacientes insistem em procurar atendimento na Santa Casa de Campo Grande. Muitos apontam a falta de confiança nas equipes de postos de saúde e UPAs como motivo para isso. 

No vídeo abaixo, a vendedora Priscilla Mascarenhas, de 25 anos, conta a experiência vivenciada em uma UPA com o filho de 2 anos, diagnosticado com paralisia cerebral. 

O vídeo também traz o relato da diarista Aline Alves, 28, que está em uma maca corredor da Santa Casa há três dias esperando vaga para internação. 

Outras dezenas de pessoas se amontoam nas salas e compartilham dores e, ainda assim, elogiam o atendimento das equipes de médicos e enfermeiros. 

"Venho muito aqui porque tenho câncer no intestino e estou em tratamento. Desde cedo espero para ser internada, mas pelo menos estou medicada e segura", afirma a dona de casa Francisca Bonfim, 59, acompanhada do marido.

O diretor-presidente da Santa Casa, Esaqueu Nascimento, diz que a superlotação no hospital é cíclica e depende do dia. "O problema é a grande demanda. No último domingo, tivemos 84 bebês internados, vindos de muitas cidades do interior, e a capacidade ficou esgotada", exemplificou.

Segundo ele, hoje, a Santa Casa tem 666 leitos ativos, mais 96 de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) pediátrica e adulta, o que não é suficiente. 

"Precisamos de mais recursos mas, ainda assim, reduzimos de 9 para 6,2 dias o tempo de permanência nos leitos, fruto de investimentos em equipamentos - muitos deles doados -, e reestruturação organizacional, que ainda vem sendo feita", diz.

Enquanto a reportagem verificava in loco os transtornos vividos por pacientes, um acordo era firmado com a Prefeitura na tarde de ontem, poucas horas após a entrevista com o gestor do hospital.

O entendimento entre Santa Casa, prefeitura e Governo do Estado garante a continuação de repasse de R$ 20 milhões para atendimento ao SUS (Sistema Único de Saúde) com a condição de o hospital receber somente casos considerados de média e alta complexidade. Ou seja, o hospital precisa deixar de ser um 'postão de saúde' e se concentrar nos casos mais graves.

Confira, na galeria, imagens de pacientes e familiares à espera de vagas para internação nas mais importantes unidades hospitalares do estado: 

Confira a galeria de imagens:

  • Diagnosticada com câncer no intestino, Francisca Bonfim recorre aos atendimentos da Santa Casa com frequencia. Hoje esperava vaga para internação.
  • Maria Gomes da Silva, 76, estava no corredor do Hospital Universitário por sentir falta de ar.
  • Rosemar Oliveira, 42, em observação na Santa Casa. Fez cirurgia para retirada de um câncer no útero e necessita de cuidados por conta da colostomia e quimioterapia.
  • Ana Maria é companheira da mãe Dulce, de 79, enquanto aguarda vaga para internação.
  • Quem também aguardava uma vaga para ser internado era o cinegrafista Ramão Gomes da Silva, 48 anos, que estava passando mal por complicações de uma cirurgia na perna realizada há 15 dias.“Estamos aqui desde domingo e sinto que piorou muito de ontem para hoje. Só orando para que ele resista”, reclama a esposa Marli Almeida, 47.
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