ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, SEXTA  19    CAMPO GRANDE 25º

Em Pauta

Ele se declarou corno, impotente e falsário

Mário Sérgio Lorenzetto | 01/12/2019 08:42
Ele se declarou corno, impotente e falsário

Para garantir um lugarzinho sob as luzes da ribalta, já houve quem se declarasse corno, impotente e falsário. Os psicólogos criminalistas também não desconhecem que aquilo que move os serial killers é o desejo de ser descoberto e ficar famoso. O Brasil praticamente não tem esse tipo de assassino, mas há uma gigantesca massa de profissionais liberais e funcionários públicos que estão dispostos a tudo.

Ele se declarou corno, impotente e falsário

Por que enlouquecem para aparecer na televisão?

Uma das hipóteses para elucidar essa loucura é a de que os homens não acreditam mais em Deus. Outrora, os homens estavam convencidos de que suas ações tinham pelo menos um espectador, que conhecia todos seus gestos (e pensamentos). Era capaz de compreendê-los e de condená-los. Mesmo sendo um marginal, um inútil, um infeliz ignorado até por seus semelhantes, alimentava-se a ilusão de que ao menos um soubesse tudo a nosso respeito.

Ele se declarou corno, impotente e falsário

"Só Deus sabe..."

"Deus sabe o que sofri", dizia a avó doente e abandonada pelos netos. "Deus sabe que sou inocente", consolava-se o injustamente condenado. "Deus sabe o quanto fiz por você", dizia a mãe ao filho ingrato. "Deus sabe como te amo", gritava o namorado abandonado. "Só Deus sabe tudo que passei", lamentava o desgraçado cujas desventuras não interessavam a ninguém.
Deus era sempre invocado como o olho ao qual nada escapava e cujo olhar dava sentido até à vida mais cinzenta e insensata.

Ele se declarou corno, impotente e falsário

O que nos resta?

O que nos resta depois de desaparecida, suprimida está a testemunha que tudo vê? O olho da sociedade, o olho dos outros. Esse é o novo olhar que buscam para não mergulhar no buraco negro do anonimato, no turbilhão do esquecimento, mesmo que o preço seja assumir o papel do bobo da corte, dançando de cueca em cima da mesa do bar. A aparição na telinha é o único substituto da transcendência. E, afinal de contas, pode ser um substituto até gratificante: podemos nos ver num além. Pensem nas vantagens de desfrutar de todos os benefícios da imortalidade e ter ao mesmo tempo a possibilidade de ser festejado em casa.

Ele se declarou corno, impotente e falsário

O duplo significado do reconhecimento.

O problema no caso de aparecer na telinha é que há um equívoco sobre o duplo significado do "reconhecimento". Todos almejamos ser "reconhecidos" por nossos méritos, por nossos sacrifícios ou qualquer outra bela qualidade. Mas quando depois de ter aparecido na TV , alguém o vê no bar e diz: "vi você ontem na TV", este alguém está simplesmente "reconhecendo você", ou melhor, a sua cara, e não seus méritos - o que é muito diferente.

Nos siga no Google Notícias