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Eduardo Coutinho, morte absurda

Cezar Benevides (*) | 03/02/2014 08:48

Domingo, 02 de fevereiro de 2014, estava tranqüilamente em casa, nesta querida cidade de Campo Grande, com a minha família quando soube da morte absurda do meu amigo Eduardo Coutinho, cineasta, diretor do famoso documentário Cabra Marcado para Morrer (1984). Fiquei profundamente entristecido e abalado.

O noticiário da Globo News me transportou ao meu passado, e me lembrei das vezes que entrei pela porta do apartamento de Eduardo Coutinho, no Rio de Janeiro, para conversarmos sobre a tragédia que abatera João Pedro Teixeira, líder camponês paraibano, assassinado na cidade de Café do Vento, em 02 de abril de 1962, tragédia que observamos através de diferentes perspectivas.

Eu era uma criança, de 8 anos de idade, morava no Centro de João Pessoa, capital da Paraíba e Eduardo Coutinho, um jovem de 20 e tantos anos que passava pela minha cidade natal para realizar um documentário, baseado em fatos reais, utilizando-se de diferentes fórmulas cinematográficas. Conheci anos depois seus familiares, inclusive Daniel, seu filho que era uma criança no início dos anos 80 do século passado. Foram os ex-deputado José Joffily (Ziu) e o seu filho o cineasta José Joffily filho os amigos que fizeram a ponte entre nossos projetos no momento em que se anunciava a abertura política, depois do regime militar.

Curiosamente, nos anos 60, o plano original de Cabra Marcado para Morrer era de um filme de ficção sobre o líder camponês assassinado, crime atribuído aos proprietários de terras do bloco agro-industrial da Paraíba. Foi realizado pelo Centro Popular de Cultura (CPC), da União Nacional dos Estudantes (UNE). O novo documentário Cabra Marcado para Morrer foi apresentado, pela primeira vez, há trinta anos, em 1984, no Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro, e eu estive lá para abraçá-lo quando merecidamente ganhou o Tucano de Ouro (de melhor filme).

Em 1985 o documentário foi lançado nacional e internacionalmente quando também publiquei Camponeses em Marcha, pela Editora Paz e Terra, em São Paulo que tinha o Conselho Editorial composto por Antonio Candido, Celso Furtado, Fernando Gasparian e Fernando Henrique Cardoso.

Conservo as mais gratas recordações de Eduardo Coutinho. Era uma pessoa generosa que acreditava nos gestos superiores dos seres humanos e muito me apoiou, da mesma forma que Ziu e José Joffily Filho. Ele me visitou depois em Curitiba e andamos muito pelas ruas da cidade, inclusive pelo Largo da Ordem.

Não sei, sinceramente, o que aconteceu, no interior do apartamento da família de Eduardo Coutinho, neste domingo trágico e fatal, mas pensei, com certo remorso, do pouco tempo que dedicamos aos amigos e também como as pessoas idosas estão sendo abandonadas agora, exatamente àquelas pessoas as quais muitas vezes devemos a vida. Foi uma verdadeira tragédia grega digna de um novo Sófocles, autor de Édipo Rei.

(*) Cezar Benevides, foi pró-reitor de Ensino de Graduação da UFMS (2000/2008) e professor da UFMS

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