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Comportamento

De Iza a Alcione, Felipe foi a 'voz' de artistas para quem não pode ouvir

Aos 24 anos, o intérprete de Libras Felipe Sampaio transforma o silêncio em espetáculo por meio da Libras

Por Clayton Neves | 23/05/2025 06:40

Enquanto multidões vibram e cantam com a potência de Alcione, a leveza de Vanessa da Mata ou o gingado de Iza, do outro lado do palco um jovem dança com as mãos e transmite emoção e informação  com o corpo. Aos 24 anos, o intérprete de Libras Felipe Sampaio transforma o silêncio em espetáculo, e já deu voz, ou melhor, sinal, a artistas como Daniel, Ludmilla, Luísa Sonza, Gaby Amarantos, Roberta Miranda, Alexandre Pires, Majur e tantos outros.

“Existe o Felipe que ama música, que é fã e que cresceu ouvindo essas vozes. Mas também tem o Felipe intérprete, que é a ponte entre esses artistas e o público surdo. Quando estou no palco, preciso traduzir a alma da música para essas pessoas”, conta o jovem, que há mais de uma década viu nascer o interesse pela Língua Brasileira de Sinais.

Segundo ele, tudo começou em Nova Andradina, quando tinha apenas 13 anos. Na escola, dividiu a sala de aula com Gabriel, um colega surdo, e por conta da relação, se aproximou da intérprete, Cristiane. Com o tempo, a curiosidade virou paixão. “No 9° ano eu já sabia que queria ser intérprete. A escola era muito inclusiva, e eu quis aprender para me comunicar”, lembra.

De lá para cá, o menino curioso virou profissional. Formado em Letras Libras pela Universidade Federal da Grande Dourados, Felipe mergulhou na educação e na cultura. Foi bolsista em projetos de extensão, ensinou Libras a técnicos administrativos e participou de um programa pioneiro que levava a língua de sinais às crianças da pré-escola em Dourados.

De Iza a Alcione, Felipe foi a 'voz' de artistas para quem não pode ouvir
Felipe tem 24 anos e teve o primeiro contato com Libras ainda na adolescência, aos 13 anos. (Foto: Arquivo Pessoal)

Mas foi em 2021 que o palco virou extensão de sua missão. Com a pandemia ainda à espreita, surgiu a primeira oportunidade de interpretar um show de Ana Canãs. “Foi uma experiência incrível. Depois veio Paulo Simões, e, em seguida, o Festival de Inverno de Bonito”, detalha.

De lá para cá, Felipe traduziu dezenas de apresentações. Além disso, criou uma equipe, profissionalizou a atuação e desenvolveu projetos de acessibilidade dentro e fora dos palcos.

Para ele, interpretar música exige mais que domínio técnico. “Não é só traduzir palavra por palavra. É entender o ritmo, a batida, o contexto. A tradução em Libras precisa ser poética, sensível. A gente acompanha a música com o corpo inteiro. A Libras é viva e se molda à arte”, define.

A preparação também faz diferença. Quando tem acesso ao repertório com antecedência, Felipe estuda cada letra para que o resultado seja mais fiel. “A emoção é outra. Quando sei o que o artista quer passar, consigo transmitir isso para a plateia surda com mais verdade”, explica.

De Iza a Alcione, Felipe foi a 'voz' de artistas para quem não pode ouvir
Felipe e o cantor Alexandre Pires durante apresentação do artista em Mato Grosso do Sul. (Foto: Arquivo Pessoal)

Ao lado de toda essa sensibilidade, há também consciência política. Felipe criou os projetos Inclui MS e Salão da Acessibilidade, dois eventos que colocam pessoas com deficiência como protagonistas da cultura. O primeiro reúne artistas e produtores com deficiência em atividades literárias e artísticas. O segundo é voltado exclusivamente à comunidade surda.

“As pessoas com deficiência também produzem arte, mas muitas vezes não conseguem acessar editais ou espaços. Criamos esses projetos para romper essas barreiras”, relata.

Ele destaca que os avanços em Mato Grosso do Sul são reais, mas ainda insuficientes. “A acessibilidade melhorou nos últimos anos, principalmente por conta das leis de incentivo. Mas ainda falta escuta. Falta o protagonismo da pessoa com deficiência dentro dos espaços de decisão”, avalia.

Ao transformar palcos em pontes, Felipe prova que Libras não é só língua, é expressão, identidade e pertencimento.

“Sem a comunidade surda, minha profissão não existiria. Tudo o que faço é pensando em como fazer arte acessível, como criar espaços em que todas as pessoas possam sentir o que eu sinto quando estou ali, diante da música”, finaliza.

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