ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
MARÇO, QUINTA  28    CAMPO GRANDE 26º

Comportamento

De tanto amar, faxineira adota aluno com paralisia cerebral aos 18 anos

Paula Maciulevicius | 10/03/2016 06:12
Manuel tem 23 anos, adora ver novela na televisão, chama a mãe adotiva de "vó". (Foto: Fernando Antunes)
Manuel tem 23 anos, adora ver novela na televisão, chama a mãe adotiva de "vó". (Foto: Fernando Antunes)

Rô é só sorrisos desde quando enxerga visita no portão de casa até a hora de mostrar o quarto do filho que se tornou o caçula da família. Primeiro voluntária e depois faxineira contratada, ela se dedica ao Cotolengo, instituição que atende pacientes com paralisia cerebral grave, há anos e de tanto amor no peito, trouxe um dos alunos para casa.

Manuel tem 23 anos, adora ver novela na televisão, chama a mãe adotiva de "vó" e transmite o quanto ama quem o acolheu pelo modo como olha e brinca com Maria Luiza, a sobrinha de 2 aninhos. Ele e Rosane já se conheciam desde os 15 anos de Manuel, quando na ocasião, ela o trouxe para morar dentro de casa por um mês. O garoto havia perdido a mãe e era cuidado pela avó.

"Ela era muito velhinha, pensei 'sabe de uma coisa? Vou pegar ele pra mim'. Conversei com a minha filha e ela disse, pode pegar. Eu truxe e não entrego nunca mais", conta Rosane Caetano Ferreira, de 50 anos.

Manuel e a sobrinha brincando. Maria Luiza adora o eterno menino. (Foto: Fernando Antunes)
Manuel e a sobrinha brincando. Maria Luiza adora o eterno menino. (Foto: Fernando Antunes)
Sozinha, Rô tira e põe o filho da cadeira de rodas. (Foto: Fernando Antunes)
Sozinha, Rô tira e põe o filho da cadeira de rodas. (Foto: Fernando Antunes)

A guarda saiu para ela em novembro de 2011 e desde o dia 27 de novembro, um domingo, a casa simples de poucos cômodos e sem reboco no bairro Mata do Jacinto, virou lar para ele também.

Rosane já tem três filhos, todos crescidos, com idade entre 35 e 21 anos, além de netos. Mas a vontade de estender o carinho é tamanha que se o imóvel fosse maior, Manuel teria outros irmãos, todos vindos do Cotolengo. "Eu gosto deles, se pudesse, trazia todas as crianças pra mim. Por que? Porque tem amor nelas", explica.

Primeiro ela se candidatou como voluntária por morar pertinho da instituição e por querer ajudar. Foram anos assim até que Rosane conseguisse trabalhar na causa, como contratada e receber remuneração. O dinheiro mensal em casa é de pouco mais de R$ 1 mil juntando o salário, mais as roupas que passa para fora e as faxinas que faz no final de semana, além do expediente.

Entre os familiares, o que Rô ouviu durante muito tempo era que tinha ficado "louca". Como resposta, dizia que estava mesmo e que enlouqueceria mais ainda se tivesse espaço. "É uma coisa que não tem explicação. Você vai e conhece uma criança dessa, olha para todos eles... É uma coisa maravilhosa", explica.

Simples, quarto do menino na casa. (Foto: Fernando Antunes)
Simples, quarto do menino na casa. (Foto: Fernando Antunes)

Manuel só grita "vó", mas também manifesta no alto som da voz quando algo o incomoda ou quando precisa sair em defesa da pequena Maria Luiza. A menina sobrinha que ele viu nascer na casa não pode levar bronca e nem chorar que ele toma as dores. Repreende, a seu modo, quem quer brigar com ela e também chama atenção ao ouvir qualquer chorinho.

Ao chegar da escola ou ao despertar, Maria Luiza corre para Manuel. Brinca de bolinhas, conversa e tem a atenção total do "tio". Como brincadeira, o menino que não cresceu joga bola no chão, na mesa que está à frente de sua cadeira, mas também passeia no shopping. A família o integrou de tal modo que Manuel foi batizado, veste orelhinhas de coelho na Páscoa e ganha festa de aniversário todo janeiro. O que aliás, ele adora, principalmente na hora de estourar as bexigas.

"Você pega amor e ele conquistou a gente de um tanto aqui. Como a gente sabe? Ele chora e para mim, é esse o amor que ele sente", descreve Rô.

Com 50 anos nas costas, ela tira e põe Manuel na cadeira de rodas sozinha. Leva para o banho, dado numa cadeira de fio, põe na cama, dá janta e troca fralda. São duas quadras que separam o Cotolengo de casa, trajeto feito em minutos pelos dois cantarolando pela rua.

Rô tem felicidade que não cabe no peito e uma bondade que lhe faz bastar a vida. O amor transborda de casa para a instituição, dos laços sanguíneos aos afetivos. Escolheu ser mãe, de novo, com mais de 45 anos e uma vida que não é fácil e nem assim reclama. A única coisa que ela gostaria é de ter uma casa maior, para dar teto e carinho a quem precisa. "A gente aprende muito, aprende a ser mais feliz, porque eles são felizes", e basta.

Curta o Lado B no Facebook.

Essa sugestão de pauta veio da jornalista, amiga e leitora do Lado B, Vivianne Nunes que escreve para o blog Cotolengo.

Na comemoração dos 23 anos, em janeiro de 2016. (Foto: Arquivo Pessoal)
Na comemoração dos 23 anos, em janeiro de 2016. (Foto: Arquivo Pessoal)
Na Páscoa passada, Manuel e Maria Luiza de "coelhinhos". (Foto: Arquivo Pessoal)
Na Páscoa passada, Manuel e Maria Luiza de "coelhinhos". (Foto: Arquivo Pessoal)
E no Natal, ele também foi à casa do Papai Noel no shopping. (Foto: Arquivo Pessoal)
E no Natal, ele também foi à casa do Papai Noel no shopping. (Foto: Arquivo Pessoal)
Nos siga no Google Notícias