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Comportamento

Mulheres boicotam evento de ciclismo que tem valor de premiação menor para elas

A inscrição tem o mesmo investimento para os dois, a prova é a mesma, no entanto o organizador diz que ''é assim mesmo''

Thaís Pimenta | 02/08/2018 06:30
Lesly pedala como amadora e se vê prejudicada com essa situação. (Foto: Acervo Pessoal)
Lesly pedala como amadora e se vê prejudicada com essa situação. (Foto: Acervo Pessoal)

Tanto elas quanto eles devem pedalar os 75km da categoria PRO do Campeonato Estadual AAAC (Associação Anastaciana e Aquidauanense de Ciclismo) no dia 5 de agosto, o valor da inscrição também é o mesmo, R$ 100,00. Mas contradizendo qualquer lógica, o valor da premiação é maior para os homens, R$ 1300,00 para o primeiro lugar, R$ 900,00 para o segundo, R$ 600,00 para o terceiro e R$ 200,00 para o quinto, enquanto que para elas, o valor do primeiro lugar é o mesmo do segundo lugar deles, R$ 900,00. Do segundo ao quinto lugar, os valores caem para para R$ 700,00, R$ 600,00, R$ 300,00 e R$ 200,00 respectivamente. 

Ao entrar em contato com o organizador, Rubens dos Santos, a equipe do Lado B ouviu que quem acompanha esse tipo de evento sabe que é assim mesmo e que essa diferença de valor se justifica porque há menos mulheres inscritas do que homens.

Um grupo mulheres se reuniu para entender tamanha diferença e ouviram coisas parecidas. Revoltadas, decidiram boicotar o evento. "A gente não vai se inscrever. Vamos boicotar porque não tem outra explicação, é puro machismo mesmo", diz a atleta Lesly Lidiane Ledesma.

Imagem do segundo pedal na Serra dos Bandeirantes, em que fica claro maioria mascullina. (Foto: Rodrigo Catelani)
Imagem do segundo pedal na Serra dos Bandeirantes, em que fica claro maioria mascullina. (Foto: Rodrigo Catelani)

Lesly ressalta que não é federada mas pensa que se já é injusto para ela, amadora, é mais ainda para uma atleta profissional. "Você pensa assim, atletas federadas, que estão na elite, elas tem os mesmos desgastes e investimentos que os homens, elas compram suplemento, bicicleta, e sobrevivem com base na parceria, um nutricionista parceiro aqui, uma academia ali. O rendimento precisa ser igual que o do homem, então porque o valor é menor?".

Para a também ciclista de mountain bike Jacqueline Hildebrand Romero, é um caso explícito de violência de gênero. "E nesse evento específico, em que soubemos que a organização além de dar premiação menor, ainda afirma que mulher tem que ganhar mesmo menor premiação, agrava ainda mais o machismo que ali está explícito".

O Lado B foi atrás de algumas outras competições para entender se, realmente, "é assim mesmo". De acordo com o organizador Walter Ernegozzi, da Ultra Maratona Pata de Onça, eles promoveram quatro edições anteriores à deste ano em que ocorria a mesma situação. Mas nesta 5ª edição, eles decidiram igualar as premiações para atrair mais mulheres.

Jacqueline vê essa situação como violência de gênero. (Foto: Acervo Pessoal)
Jacqueline vê essa situação como violência de gênero. (Foto: Acervo Pessoal)

"A ideia era tornar igual a premiação mas antes não conseguimos fazer isso porque o número de participantes homens era muito maior e o valor da premiação vem das inscrições", explicou ele.

Já de acordo com o organizador do 3º Desafio Pantanal Aventura de Mountain Bike, Fabio Pantaneiro, em sua competição, mesmo sem premiação em dinheiro, os troféus são os mesmos. "Temos dois valores de inscrições diferentes porque uma inclui o valor da camiseta de ciclista e a outra não, essa é a nossa única diferença".

No MTB Bonito 2018 os valores também são iguais, independente do gênero do inscrito. "O nosso aqui a gente premia da mesma forma, masculino e feminino, as categorias são as mesmas. A gente tenta igualar até porque tem crescido a categoria feminina, e as mulheres estão se destacando", diz o organizador Zilnei Souza Ventura.

Carlos César Gimenes, Presidente da Federação Sul-Mato-Grossense de Ciclismo, disse que não há uma lei que regulamenta as provas. "Apenas na categoria Elite é necessário que as categorias feminino e masculino distribuam o mesmo valor em premiação, nas provas de alto rendimento", justifica.

Depois do mesmo bafafá acontecer a nível nacional em relação ao skate feminino, as mulheres se questionam como ainda precisam passar por esse tipo de situação dentro do esporte. Isabela Silveira é de outra área, da corrida, e também já teve de boicotar evento e, inclusive, foi até mesmo bloqueada pela organização, quando questionou o valor mais baixo de premiação para elas.

''Acredito que quanto menor o incentivo, menos as mulheres irão se propor a estar nas competições. Mesmo sendo maioria em várias delas'', diz.

''Essa desigualdade de gênero tem que a acabar, os homens estão na rua livremente e as mulheres não, porque ficam vulneráveis. Tem o assédio, a desigualdade. Quando se pensa na prática dos esportes parece que isso é muito mais para os homens do que para as mulheres. As mulheres têm que praticar esportes, precisam de poder e visibilidade. Têm que reivindicar a igualdade, o lugar da mulher, incentivar as atividades, e não o oposto'', completa Jacqueline.

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