ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no X Campo Grande News no Instagram Campo Grande News no TikTok Campo Grande News no Youtube
JULHO, SEXTA  25    CAMPO GRANDE 31º

Meio Ambiente

Tamanduás-bandeira viram "detetives ecológicos" em projeto na APA Guariroba

Dados de deslocamento serão usados para prevenção de acidentes nas estradas

Por Inara Silva | 24/07/2025 06:32
Tamanduás-bandeira viram "detetives ecológicos" em projeto na APA Guariroba
Tamanduá-bandeira rastreado carrega filhote (Foto: Ale Bertassoni)

Uma das principais vítimas de acidentes nas estradas de Mato Grosso do Sul, o tamanduá-bandeira tornou-se um detetive-ecológico e tem contribuído para que  pesquisadores possam entender os padrões de movimentação dos animais, apontando caminhos para a proteção da biodiversidade e dos próprios motoristas. A pesquisa  do projeto Bandeiras e Rodovias tem monitorado a espécie na Apa (Área de Proteção Ambiental) do Guariroba, em Campo Grande.

RESUMO

Nossa ferramenta de IA resume a notícia para você!

Pesquisadores monitoram 14 tamanduás-bandeira na APA Guariroba, em Campo Grande (MS), utilizando coletes com GPS para estudar padrões de movimentação. O projeto visa compreender aspectos como dispersão, reprodução e comportamento da espécie, contribuindo para sua proteção. O estudo faz parte do projeto Bandeiras e Rodovias, que já identificou o tamanduá-bandeira como principal vítima de atropelamentos em rodovias do estado. Entre 2017 e 2020, foram registradas 766 mortes da espécie, levando à implementação de medidas como passagens de fauna e cercamento de rodovias para reduzir acidentes.

Com 35 mil hectares, divididos em três áreas, a APA do Guariroba tem sido campo de estudo desde o ano passado, quando 15 tamanduás-bandeira começaram a ser rastreados. Em 2025, o trabalho está em fase de captura de novos animais e, até o momento, 14 tamanduás-bandeira já receberam o colete de telemetria, que são equipados com tecnologia GPS e VHF. Esse número provavelmente vai aumentar, pois o trabalho deve prosseguir por mais duas semanas.

Pesquisadora do projeto Bandeiras e Rodovias, a veterinária Grazielle Soresini explica que a busca ativa é realizada de maio a julho por conta do hábito do tamanduá, que é noturno, mas, em período de temperaturas mais baixas, são avistados mais facilmente durante o dia. A APA Guarariba tem predominância de monocultura, com fazendas de pecuária e pastos. Esse fato facilita o avistamento dos animais.

Tamanduás-bandeira viram "detetives ecológicos" em projeto na APA Guariroba
Equipe do Icas em trabalho de campo (Foto: ICAS/Programa de Conservação do Tamanduá-bandeira)

Nos demais períodos do ano, os pesquisadores têm feito o monitoramento da dispersão dos tamanduás rastreados, que têm a localização registrada a cada 20 minutos. Estes são capturados regularmente para check-up da saúde e possíveis ajustes no colete. A veterinária Grazielle Soresini afirma que os primeiros relatórios gerados pelo GPS só devem ser finalizados no ano que vem.

Segundo Soresini, o rastreamento permite aos pesquisadores compreender de forma detalhada aspectos como dispersão, taxa reprodutiva, maturidade sexual, longevidade e comportamento parental da espécie. Com os hábitos do animal, é possível também conhecer a "permeabilidade da paisagem", o que permite o planejamento de corredores ecológicos e assim garantir a conectividade dos habitats, medida essencial para a sobrevivência da espécie.


Resultados

O trabalho do projeto Bandeiras e Rodovias começou em 2017, na fazenda Santa Lourdes, em Nova Andradina, e já contabiliza resultados como a publicação de um guia de mitigação de colisões, um manual técnico em uma resolução estadual oficial e um plano para mitigação de colisão com fauna. Além disso, foi elaborado um mapa dos trechos de maior probabilidade de colisão com fauna, após monitoramento de mortes nas seguintes estradas:

  • BR-262, que liga Campo Grande a Corumbá, no Pantanal,

  • BR-163, que corta o Estado de norte a sul,

  • A rodovia MS-040, no Pantanal de Aquidauana,

  • BR-267, em Nova Andradina.

Na época, de 2017 a 2020, foram contabilizadas 12 mil carcaças de animais nas quatro rodovias, sendo o tamanduá-bandeira a principal vítima, com 766 mortes. Conforme o levantamento, em 40% dos casos o acidente representou risco de danos materiais e à vida humana e da fauna. No ano passado, o projeto fez levantamento de carcaças ao longo da BR-262, entre Campo Grande e a  Ponte do Rio Paraguai, com total de 2.300 animais mortos, de abril de 2023 a abril de 2024.

Conforme Grazielle Soresini, dentro do grupo dos mamíferos, os tatus e tamanduás, que fazem parte da ordem dos xenarthras, representam o maior número de vítimas. Foram encontrados mais de 200 tamanduás-mirins e tamanduás-bandeira pela equipe neste último ano. Tatus "peba" e "galinha" ocupam o primeiro lugar entre as espécies mais encontradas, totalizando mais de 400 indivíduos.

Tamanduás-bandeira viram "detetives ecológicos" em projeto na APA Guariroba
Tamanduá-bandeira atropelado na estrada (Foto:  ICAS/Programa de Conservação do Tamanduá-bandeira)

Ações práticas

Em sua terceira fase de desenvolvimento, o Projeto Bandeiras e Rodovias está na implementação das soluções. Isso inclui workshops sobre sinalização viária eficiente e a participação ativa no Fórum Rota Sustentável, um espaço de diálogo para discutir estratégias de prevenção.

A mais recente iniciativa é o Observatório “Rodovias Seguras para Todos”, uma ação coletiva de seis organizações da sociedade civil que une ciência, conservação e segurança viária para reduzir as colisões com fauna e tornar as estradas mais seguras.

Observatório atua como instrumento de monitoramento com a finalidade de garantir que as medidas mitigatórias sejam implementadas, eficazes e alinhadas com as boas práticas de conservação. Atualmente, está sendo implementado o plano de mitigação da BR-262, elaborado pela ViaFauna, empresa contratada pelo DNIT.

Tamanduás-bandeira viram "detetives ecológicos" em projeto na APA Guariroba
Tamanduá-bandeira carrega filhote (Foto: ICAS/Programa de Conservação do Tamanduá-bandeira)

Monitoramento

O foco principal do projeto está nos tamanduás jovens, em fase de dispersão, que deixam sua área de origem em busca de novos territórios. Ao acompanhá-los, os pesquisadores conseguem mapear suas rotas, analisar como interagem com diferentes ambientes e  identificar quais áreas ainda permitem sua passagem e quais se tornaram barreiras intransponíveis.

A importância do tamanduá-bandeira vai além de ser um indicador de colisões. Essa espécie, com seu olfato altamente desenvolvido (cerca de 40 vezes mais apurado que o dos humanos), língua de 60 centímetros, que captura 30 mil insetos por dia, e garras poderosas usadas para defesa e para abrir formigueiros, é um símbolo da biodiversidade do Cerrado.

Sua reprodução também é um fator importante em sua conservação, pois a fêmea gera filhote por ano após seis meses de gestação, com o filhote dependente da mãe nos primeiros meses.