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Reportagens Especiais

Ano escancarou o risco invisível das bebidas clandestinas em fábrica e boates

Exames afastaram surto do metanol, enquanto operações miraram produção e comércio

Por Bruna Marques | 29/12/2025 09:14


RESUMO

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Em outubro de 2025, Mato Grosso do Sul enfrentou um alerta sobre bebidas adulteradas após a morte de Matheus Santana Falcão, de 21 anos, em Campo Grande. Inicialmente suspeita-se de intoxicação por metanol, porém laudos posteriores indicaram apenas alto teor de etanol no organismo do jovem. A Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Contra as Relações de Consumo intensificou as fiscalizações no estado, descobrindo uma fábrica clandestina em Terenos que produzia bebidas em condições insalubres. Apesar de não haver casos confirmados de contaminação por metanol, as autoridades mantêm o alerta sobre riscos de bebidas irregulares, especialmente as importadas do Paraguai.

No início de outubro de 2025, Mato Grosso do Sul entrou no radar nacional da preocupação com bebidas adulteradas após um caso de forte repercussão no Estado: a morte de Matheus Santana Falcão, de 21 anos, em Campo Grande. A investigação inicial levantou a hipótese de intoxicação por metanol, substância altamente tóxica.

Na noite de 2 de outubro, Matheus deu entrada na Unidade de Pronto Atendimento Universitário com náuseas intensas, dores abdominais e vômitos, depois de ingerir bebidas alcoólicas. O quadro evoluiu rapidamente e ele morreu cerca de uma hora e meia depois. A Polícia Civil e a Vigilância Sanitária recolheram garrafas de cachaça e vodca. Amostras de sangue e urina foram encaminhadas ao Lacen (Laboratório Central de Saúde Pública), conforme noticiado pelo Campo Grande News.

A família recebeu a notícia com choque e revolta. O velório e o sepultamento foram marcados por forte comoção, com relatos sobre a vida do jovem e a busca por respostas.

Dias depois, os laudos descartaram a presença de metanol no organismo. A análise toxicológica apontou níveis de etanol quatro vezes acima do limite legal, mas não identificou o composto metanol.

O contexto nacional, porém, ajudou a inflar o alerta. Naquele período, o país enfrentava um surto de intoxicações por metanol em outras regiões, com dezenas de casos suspeitos e mortes confirmadas em estados como São Paulo, mantendo o tema em evidência na agenda sanitária.

Ano escancarou o risco invisível das bebidas clandestinas em fábrica e boates
Garrafas de bebidas encontradas vazias em fábrica clandestina de Terenos (Foto: Divulgação)

“Não há confirmação de metanol no Estado, apenas suspeita”

A Decon (Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Contra as Relações de Consumo), de Mato Grosso do Sul, comandada pelo delegado Wilton Vilas Boas, atuou em diversas frentes ao longo de 2025 e reforçou que, até agora, não existe confirmação laboratorial da presença de metanol no Estado. Segundo ele, “até o momento não há confirmação laboratorial da presença de metanol nas análises realizadas no Estado; o que houve foi principalmente suspeita ainda sob investigação”.

O alerta ganhou peso no dia 4 de outubro, quando uma operação de fiscalização em casas noturnas e tabacarias de Campo Grande escancarou o risco real do consumo de bebidas clandestinas na noite da Capital. A ação resultou na apreensão de bebidas sem nota de origem no Valley Pub, localizado na Avenida Afonso Pena, e na condução do gerente à delegacia. Parte dos produtos também estava com prazo de validade vencido, o que reforçou as suspeitas de irregularidades no armazenamento e na comercialização.

Ano escancarou o risco invisível das bebidas clandestinas em fábrica e boates
Wilton Vilas Boas, delegado titular da Decon (Foto: Marcos Maluf)

O delegado destacou que esse tipo de situação não é pontual. “A gente fiscaliza vários locais todos os dias. No caso das bebidas, o maior problema é a busca por maior lucro com menos despesa”, afirmou. Ele explicou que muitos estabelecimentos estão regulares no papel. “São legais, registrados, têm alvará, tudo certo. Mas acabam comprando bebidas do Paraguai, sem nota fiscal".

Questionado se isso ocorre até em locais regularizados, Vilas Boas foi direto. “Sim. O bar está regular, o evento está regular, mas a bebida não. Muitas vezes não apresentam nota fiscal ou a origem é o Paraguai. Isso acontece muito em festas".

Fiscalização diária e o “jeitinho” do lucro fácil

De acordo com Vilas Boas, a fiscalização não se limita a bares de bairro e inclui eventos de grande porte. “Quando cheguei aqui, a partir de junho, começamos a fiscalizar festas de forma antecipada. Não é para acabar com a festa”, explicou. Segundo ele, toda a estrutura é montada antes. “Palco, bebidas, tudo. Se a gente chega só no dia, pode gerar interdição e outro problema para o consumidor, que já pagou ingresso. Antecipando, o impacto é menor".

O delegado afirma que a estratégia tem efeito prático e ajuda a reduzir riscos como os identificados na operação de outubro. “Quando fiscalizamos, a notícia se espalha. O pessoal já fala: ‘Vamos tomar cuidado, porque se tiver bebida irregular, vai ser apreendida’.” Ele acrescenta que a fiscalização de última hora costuma gerar mais prejuízo. “Se isso acontece em cima da hora, eles têm que comprar outra bebida às pressas. Dá mais trabalho e prejuízo".

Ano escancarou o risco invisível das bebidas clandestinas em fábrica e boates
Bebidas recolhidas pela Decon em conveniência fiscalizada em Campo Grande (Foto: Marcos Maluf)

Fábrica clandestina em Terenos e outros alertas - Em 2025, a única fábrica clandestina de bebidas fechada pela Decon funcionava em Terenos. No local, eram produzidos vodca e vinho de forma irregular. O responsável vendia principalmente para atléticas universitárias.

“Tivemos operações recentes, como no autódromo e também essa fábrica clandestina em Terenos. Esses casos ajudam a alertar? Com certeza”, afirmou o delegado.

Segundo Vilas Boas, o risco costuma ser subestimado. “As pessoas não têm noção. Acham que, por ser bebida, não vai acontecer nada.” Ele detalhou o principal perigo. “O problema começa na produção. A gente já foi estudante, sabe como funciona: mistura tudo num caldeirão. Às vezes não é nem metanol. É sujeira”.

No caso de Terenos, o cenário era crítico. “O tanque de água estava sujo, garrafas vazias no chão, pombo, fezes de rato. Isso já é suficiente para contaminação por bactérias”.

Ano escancarou o risco invisível das bebidas clandestinas em fábrica e boates
Equipes de fiscalização durante apreensão em fábrica clandestina de Terenos (Foto: Divulgação)

Metanol não confirmado, risco confirmado - Apesar de não haver casos comprovados de intoxicação por metanol em Mato Grosso do Sul, o alerta permanece. “Não temos casos confirmados de metanol aqui, mas o risco continua. A contaminação bacteriana pode causar infecção grave”, disse o delegado. Para pessoas com imunidade baixa, segundo ele, o perigo é ainda maior.

O principal recado para consumidores e organizadores de eventos é simples. “Desconfiar do preço. Se está muito abaixo do mercado, tem algo errado. Perguntar por que está mais barato. Comprar de fornecedor regularizado”.

Outro ponto recorrente é a falsa sensação de segurança em relação a bebidas vindas do exterior. “Muita gente acha que bebida do Paraguai é original. Não necessariamente”, alertou. “No Paraguai também existe bebida falsificada. Vende marca conhecida falsificada. Não dá para saber onde foi feita, em que condições".

Ele conclui que não existe um perfil único de falsificação. “Antes diziam que falsificavam mais o que era barato, como energético. Depois veio a lógica contrária: falsificar o mais caro dá mais lucro. No fim, são as marcas mais tradicionais, as que mais vendem”.

Ano escancarou o risco invisível das bebidas clandestinas em fábrica e boates
Vinhos e espumantes de diferentes rótulos foram apreendidos em boate da Capital (Foto: Gabi Cenciarelli)

O legado de 2025 - O ano de 2025 ficará marcado em Mato Grosso do Sul pela combinação de alarme público e investigação técnica. A morte de Matheus, inicialmente tratada como suspeita de intoxicação por metanol, foi atribuída ao consumo excessivo de etanol em níveis tóxicos.

Isso não elimina a necessidade de vigilância, mas afasta a narrativa de um surto de metanol no Estado. Para a Decon, o caso reforça a importância de fiscalização integrada, rigor técnico e foco na proteção do consumidor.

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