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Vale a pena encarar a revolução trazida pelas metodologias?

Por Felipe Massardo (*) | 10/10/2017 07:15

A adoção de metodologias ágeis de desenvolvimento de software é, habitualmente, uma unanimidade “teórica” em grande parte das empresas de TI, inclusive nas mais tradicionais. Digo teórica, pois, conceitualmente falando, é muito bem aceita. É um paradigma de fácil convencimento e de fácil vendagem para diretorias e altas gerências. Mas, na prática, a implantação dessas metodologias sofre bastante resistência, em todos os níveis das organizações, da cúpula diretiva à equipe técnica.

Como toda mudança, alterar a forma de desenvolver software requer a saída da zona de conforto, trocar o certo pelo duvidoso, com muitas dificuldades, riscos, erros e acertos até que os resultados e os ganhos reais comecem a aparecer. Neste processo, quando não há total apoio e comprometimento do patrocinador da mudança, nas primeiras dificuldades o processo tende a ser abandonado, voltando-se imediatamente ao modus operandi da empresa.

Metodologias ágeis trazem uma série de vantagens em relação às tradicionais, e duas delas merecem destaque especial. A primeira é a entrega constante e regular de software funcional. O cliente não precisa aguardar a finalização do projeto para testá-lo e, principalmente, validá-lo. Isso nos leva para a segunda vantagem, talvez a mais importante: rápida resposta a mudanças. No mundo real, raramente um cliente possui a perspectiva detalhada do que exatamente ele deseja em seu software. Em geral, o que existe é uma ideia muitas vezes vaga da necessidade do cliente. Neste nível de abstração, as mudanças são frequentes e perfeitamente normais. Há uma tendência de que as incertezas sejam reduzidas conforme avança o desenvolvimento e o cliente vislumbra cada vez mais o resultado final.

Uma forma de reduzir as mudanças de escopo, independentemente da metodologia, é a troca de foco. Ao invés de se tentar detalhar a ideia vaga que o cliente possui, exigindo “certezas” que o mesmo não pode fornecer, torna-se mais eficiente entender a fundo o problema que se deseja resolver e então propor um software para esse propósito.

A adaptação do usuário a uma nova metodologia muitas vezes é uma mudança cultural. Sair da zona de conforto envolve algo bem mais profundo do que mudanças de atitudes. A grande mudança necessária é na cultura organizacional. Não basta apenas executar diferente, é necessário pensar diferente, não só na fase de execução dos projetos, mas desde a concepção das primeiras ideias acerca do produto até a entrega final. Via de regra, as metodologias ágeis seguem o Manifesto Ágil, que consiste em princípios fundamentais para o desenvolvimento rápido e eficiente de software. Isto não significa que a adoção não possa ser combinada com outras metodologias de gerenciamento de projetos.

Um grande ganho ao se adotar uma metodologia ágil, principalmente em relação ao desenvolvimento tradicional, encontra-se na mudança de comportamento por parte do cliente. Este, que antes participava como um mero expectador do processo atuando apenas no início e no final do projeto, passa a exercer um papel que vai além do simples cliente, tornando-se um “cliente-parceiro”. Esta necessidade é uma característica inerente do processo de desenvolvimento ágil de software, tendo em vista que as entregas parciais só fazem sentido se forem validadas pelo cliente. Talvez ele tenha dificuldades em entender a razão de precisar gastar seu tempo e dinheiro para adquirir um software. Quanto maior seu envolvimento no processo, menor a chance do produto não atender às suas expectativas.

É preciso deixar claro que quanto mais tarde ocorrerem as solicitações de mudanças, maior será o custo e o atraso.

Apesar de as vantagens do desenvolvimento ágil de software serem evidentes, é preciso ressaltar que o processo só funciona se a equipe for adequada para trabalhar dessa forma. Em outras palavras, metodologias ágeis não funcionam em todas as equipes. O requisito básico é que a mesma seja autogerenciável. O autogerenciamento é um conceito amplo. De forma simplificada, uma equipe autogerenciável é aquela que possui a capacidade de organizar sua forma de trabalho da maneira mais eficiente possível, de maneira autônoma.

É como se a equipe fosse uma microempresa dentro da organização, que possui demandas e entrega resultados sem a necessidade de alguém lhe dizer como deve organizar seu trabalho, como deve ocorrer a comunicação interna, como devem ser distribuídas as tarefas, enfim, sem nenhuma necessidade de microgerenciamento.

Todos os membros da equipe precisam atender a um perfil específico para fazer parte de uma equipe autogerenciável. Caso contrário, desorganização e conflitos surgirão e poderão chegar ao ponto de comprometer a qualidade, os prazos e a equipe como um todo. Este perfil específico demanda conhecimento técnico, alta capacidade de trabalho em equipe, organização e comprometimento.

A implantação de uma metodologia ágil é um processo bastante complexo, especialmente em uma empresa tradicional, por envolver abandono da zona de conforto e profundas mudanças culturais e de processos. Assim, todo o processo deve ser realizado de maneira gradativa, sendo o menos taxativo possível, envolvendo muito diálogo e ajustes constantes, especialmente nos primeiros projetos. É preciso ter a humildade de reconhecer que é muito
difícil acertar de primeira, além de coragem e perseverança para não desistir diante das primeiras barreiras. É preciso ter investimentos e uma boa dose de risco. Os ganhos certamente fazem o esforço valer a pena.

(*)Felipe Massardo é coordenador de projetos no Instituto das Cidades Inteligentes (ICI).

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