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Em Pauta

Contestados ou adorados: a origem dos santos católicos

Mário Sérgio Lorenzetto | 10/07/2019 06:29
Contestados ou adorados: a origem dos santos católicos

É difícil entender tanta contestação no século XXI. Dureza mesmo era ser um santo no cristianismo primitivo, de raiz, que se desenvolveu nos três primeiros séculos depois de Cristo. Só o ato de assumir-se como cristão já era uma decisão só para os muito fortes, muito corajosos. Implicava o heroísmo daqueles que se dispõem a morrer.
Diferentemente da mamata que é hoje, quando os seguidores de Cristo estão na dianteira entre as religiões do mundo - com 2,2 bilhões de pessoas contra 1,6 bilhão de muçulmanos -, naquele tempo eles formavam uma espécie de contracultura em clara oposição aos valores do Império Romano. Aos olhos das autoridades, a recusa dessa diminuta minoria em demonstrar devoção a deuses como Mitra, Júpiter ou Minerva, parecia coisa de traidor do Estado. Alguém que contrariava a virtude cívica. Por isso, os que tinham fé naquele judeu que morreu - quase certamente em uma cruz em "X" e não em "T" - não eram bem aceitos. Mas, se logo depois de Cristo eram mal vistos, só começaram a ser efetivamente perseguidos depois de Nero, que lhes culpou do grande incêndio de Roma em 64 d.C.. Gerou uma onda de justiçamento dos cristãos. Como dizem os brasileiros a respeito dos bandidos: "prendiam, matavam e arrebentavam". Há um autor de Cartago chamado Tertuliano que viveu nessa época que exprime bem o que era ser cristão: "Se o [rio] Tibre transbordou [matando os romanos], se o [rio] Nilo permaneceu em seu leito [levando a seca ao Egito], se o céu tem estado calmo, ou a terra em movimento, se a morte andou devastando, ou a fome trouxe seus tormentos, o grito imediato é: "cristãos aos leões!".

Contestados ou adorados: a origem dos santos católicos

O começo da virada com Paulo de Tarso.

Mesmo com tudo jogando contra, essa onda cristã - que começara em Jerusalém - logo se espalhou assumindo a forma de comunidades na Grécia, na Turquia, na Síria e na Armênia. Verdadeiramente, são apenas esses países que aguentaram as perseguições. Estranho ver que três deles são muçulmanos na atualidade. Esse avanço do cristianismo é creditado a Paulo de Tarso - futuro São Paulo, um perseguidor implacável de cristãos que teria presenciado uma epifania e se convertido, tornando-se o maior relações públicas de todos os tempos. Estava disposto a viajar, pagando as próprias despesas, para locais distantes onde a mensagem cristã poderia espalhar-se. Na véspera de sua execução afirmou: "Lutei o bom combate, terminei a carreira, mantive a fé".

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O Édito de Tolerância de Constantino.

Tudo mudará em 311 d.C. com o imperador Constantino. Os maus-tratos e as perseguições sumiram. Esse imperador, filho de uma cristã, promulgou o Édito de Tolerância, documento que deveria ser lido e lembrado por todos os brasileiros que adoram odiar seus semelhantes. As vilanias dos tempos de Valeriano de Diocleciano foram proibidas. Havia ferocidade nos tratamentos aos cristãos.

Contestados ou adorados: a origem dos santos católicos

O circo sádico dos horrores.

É incompreensível ver tantos cristãos - até padres e pastores - admirando a "grandeza" do Coliseu de Roma. Foi nessa arena , nesse circo sádico de horrores, que milhares de cristãos foram devorados por leões. O primeiro foi Inácio de Antioquia, importante teólogo do cristianismo. Também era bastante comum crucificar os cristãos (cruz em "X") São Pedro e Santo André foram os primeiros. Também condenavam cristãos a virar churrasco. Não é exagero. Lourenço de Huesca foi levado a uma churrasqueira literal. Os algozes construíram uma espécie de grelha, disposta em cima de brasas e colocaram o cristão. Teria de ser torrado. São Lourenço (todos seus seguidores passaram a usar sobrenomes começando por Loren, tal como Lorenzetto, Lorenzetti, ou Sofia Loren) encarou o martírio com a alma leve. Bem humorado, disse a seus carrascos: "Este lado de meu corpo já está bem assado, podem me virar agora".

Contestados ou adorados: a origem dos santos católicos

Feriados, pontos de encontros e cemitérios secretos.

Um costume que logo ficou estabelecido foi dar atenção especial aos restos daqueles que foram martirizados. Enterravam em locais que pudessem servir de pontos de encontros, para que ocorresse uma celebração anual. Vem daí o costume dos dias dedicados aos santos: os feriados. Em geral, eram cemitérios secretos. Em Roma eram catacumbas - galerias subterrâneas, inacessíveis aos olhares dos perseguidores. Quanto mais matavam cristãos, mais o calendário comemorativos aumentava - e eram confraternizações repletas de rituais. Havia leituras, salmos e orações, quando possível a Eucaristia - o momento em que um fiel oferece a hóstia a outro. Ao término das perseguições, esses ritos de veneração aos mártires já estavam consolidados. Igrejas passaram a ser construídas em cima do pedaço de chão em que seus heróis estavam enterrados. Como pode um verdadeiro herói ser contestado? Eram supercristãos.
Séculos antes de existir a canonização, o culto a eles já era indissociável das boas práticas cristãs. Aquelas que estão desaparecendo. Ceifadas pelo ódio.

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