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Polícia para quem precisa

Apoiados por uma fatia da sociedade, policiais coagem ao invés de protegerem

Por Victor Barone (*) | 15/12/2015 16:30

Há um largo abismo entre apoiar a legítima ação policial no intuito de garantir a segurança da população mediante ações de fiscalização e blitze e o patrocínio de demonstrações de intolerância e totalitarismo como as que vem sendo vítima a jornalista Izabela Sanches, do site de notícias TopMídiaNews, de Campo Grande (MS), desde domingo (13), quando publicou uma reportagem sobre a ação da Polícia Militar em um bar da cidade.

A matéria causou furor na fatia (cada vez mais espessa) da sociedade que apoia a truculência policial sob argumentos do tipo “bandido bom é bandido morto”, “polícia tem mesmo que abordar qualquer um na hora que quiser”, “se não deve está reclamando de que?” e quetais do gênero.

Segundo a reportagem de Izabela, uma simples pergunta - "Por que vocês estão revistando eles”? – foi o suficiente para desencadear ações violentas de policiais militares em um bar próximo a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) na noite de sexta (4) para sábado (5). “E quem eram eles? Eles são três meninos negros, menores de idade, que foram revistados por policiais militares sem justificativa”, afirma a jornalista.

Alguns jovens foram detidos e encaminhados para uma delegacia, onde foram expostos a situações vexatórias pelos policiais de plantão para o delírio de quem imagina que o papel da polícia em um Estado Democrático de Direito é humilhar cidadãos que não “se comportam” da forma com a qual eles creem que as pessoas devem se portar. Posteriormente, foram liberados.

Este seria o fim de mais um caso de abuso de autoridade policial não fosse a claque fascista que hoje dá as caras cheia de coragem e fanfarronice nas redes sociais. No Facebook, o responsável (anônimo) pela fanpage “Ser policial por amor”, disparou referindo-se a jornalista:

Polícia para quem precisa

Há um largo abismo entre apoiar a legítima ação policial no intuito de garantir a segurança da população mediante ações de fiscalização e blitze e o patrocínio de demonstrações de intolerância e totalitarismo.

“[...] é aquelas feministas da esquerda, que adora fumar maconha e mostrar os peitos em praça pública. Na matéria, ela cita os bêbados baderneiros, maconheiros, mas diz que eles estavam sentados num canto do bar e que foram revistados só os negros. A animal também diz que os baderneiros ficam na rua apenas para atravessar de um bar para outro. E que a polícia agrediu "estudantes". Segundo ela, ninguém desacatou os PMs, apenas questionaram o motivo da abordagem”.
E prosseguiu...

“Vou tirar minha conclusão: Essa menina do TopMídia News é caso de saúde pública. A Polícia Civil realizou, ontem, uma operação para evitar arrastões no Shopping Campo Grande, como vem acontecendo ultimamente. A doença da esquerda é grave. A imprensa local fedorenta não questiona roubos, furtos e violência nos arrastões, mas sim a ação da polícia para evitá-los. Apesar da foto conter mais jovens brancos, a "jornalista" (kkkk) só enxergou os negros. Afinal, é um motivo para protestar e ganhar mas de curtidas no facebook” [sic].

Finalmente, conclui com uma pérola digna dos anos de chumbo...

“Imprensa vagabunda, suja, asquerosa. Vão aprender a respeitar a Polícia na marra”

Orientada pela empresa e por advogados, Izabela registrou boletim de ocorrência - teve mais sorte que os jovens detidos e humilhados (na delegacia, os policiaiss se negaram a registrar um BO relatando a agressão alegada pelos jovens). O Jornal TopMídiaNews também está tomando as medidas legais para identificar e processar o responsável pelos ataques e ameaças.

Seria a regra dizer agora que a atitude expressa pela fanpage não representa o pensamento da maioria dos policiais militares de Mato Grosso do Sul. Temerário afirmar isso.

Polícia para quem precisa

A Polícia Militar é uma escola de violência na qual servidão aos oficiais, abusos físicos, psicológicos e disciplinares fazem parte da rotina de profissionais que são jogados na rua com o dever de proteger a população mas que, via de regra, acabam sendo equiparados a bandidos dada a truculência de seu manejo e a corrupção que impera em suas práticas. A institucionalização de violações de direitos humanos dentro da PM na formação e treinamentos dos seus integrantes reflete-se diretamente na maneira como reagem no cotidiano com a população.

Com isso, infelizmente, os bons exemplos somem em meio ao caos do desmando e dos excessos.

E o problema não é só da Polícia Militar, ele está entranhado em uma sociedade que imagina-se mais segura diante de uma polícia guiada por valores totalitários. Valores que embasaram o que ocorreu no último domingo (13), quando seis delegacias de Campo Grande pararam para que 250 policiais atendessem ao pedido higienista de uma empresa – o Shopping Campo Grande. Dois mil jovens - a imensa maioria oriunda de bairros de baixo poder aquisitivo – foram abordados pelos agentes nos arredores do shopping. Alguns foram presos por estarem consumindo bebidas alcoólicas ou fumando maconha. Outros, detidos por estarem sem documentos ou sob outros argumentos caquéticos dos áureos tempos da ditadura.

A preservação da ordem pública é função das forças policiais. São elas que devem assegurar o exercício dos direitos do cidadão. No exercício de suas atribuições, os órgãos policiais podem empregar a força necessária para o restabelecimento da paz e da tranquilidade pública e até limitar direitos individuais. O uso da força, no entanto, não autoriza a prática do abuso. Os agentes policiais devem tratar o cidadão com respeito, garantir seus direitos. Afinal, vale lembrar que agentes policiais no exercício de suas funções também estão sujeitos ao limites da lei.

(*) Victor Barone é jornalista, diretor da Semana On

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