Da promessa à catedral: como Santo Antônio moldou a história de Campo Grande
Conhecido como padroeiro da Capital, Santo Antônio é símbolo de proteção e origem

Campo Grande nasceu da fé e da promessa de um homem que confiava na proteção de Santo Antônio. Em 1875, o mineiro José Antônio Pereira deixou Montes Claros (MG) em busca de novas terras para viver com sua família. Trouxe consigo não apenas 72 pessoas e pertences, mas também um sonho e uma forte devoção ao santo de Pádua, cuja imagem viajava junto à comitiva.
RESUMO
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Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul, teve sua origem ligada à fé em Santo Antônio. Em 1875, José Antônio Pereira, devoto do santo, deixou Minas Gerais com sua família em busca de novas terras. Durante a viagem, um surto de malária ameaçou a vida da comitiva. José Antônio fez uma promessa: se todos sobrevivessem, construiria uma igreja em homenagem ao santo. Cumprindo a promessa, José Antônio ergueu uma capela em 1879, no local onde hoje é o centro de Campo Grande. A partir daí, surgiu o Arraial de Santo Antônio, que deu origem à cidade. A pequena capela se tornou a Catedral Metropolitana de Santo Antônio, símbolo da fé que moldou a cidade. A devoção ao santo, conhecido por seus milagres, permanece viva na comunidade, com a tradicional distribuição do Pão de Santo Antônio e o Bolo de Santo Antônio, recheado de medalhinhas e alianças.
Durante o trajeto até o sul do antigo estado de Mato Grosso, a família enfrentou um grande desafio: ao passar por Santana de Paranaíba, um surto de malária obrigou a caravana a permanecer no local por três meses. Diante do risco de morte, José Antônio fez uma promessa: se todos sobrevivessem e chegassem em segurança ao destino, ele construiria uma igreja dedicada a Santo Antônio, seu “santo amigo”.
A promessa foi cumprida. Em 1879, ao se estabelecer na confluência dos córregos Prosa e Segredo, onde hoje se localiza o Centro da Capital sul-mato-grossense, José Antônio construiu uma pequena capela de pau-a-pique. Ali, foram celebrados os dois primeiros casamentos e cinco batizados, pelo padre Julião Orquiza, de Nioaque. Nascia, então, o Arraial de Santo Antônio, que daria origem à cidade de Campo Grande, oficializada como município em 26 de agosto de 1899.
“Santo Antônio já estava aqui antes mesmo da cidade existir oficialmente. O povo campo-grandense nasceu a partir de uma fé, uma fé que foi comprovada pela proteção divina e por um gesto de gratidão dessa família. Hoje, nós somos os continuadores dessa história”, afirma o padre Wagner Divino de Souza, pároco da Catedral de Santo Antônio, localizada na região central da cidade.

A fé que moldou a cidade também moldou sua paisagem. A pequena capela construída no século XIX evoluiu ao longo das décadas. Em 1912, surgiu a primeira paróquia. Nos anos seguintes, ela foi demolida e reconstruída para atender ao crescimento populacional. Em 1991, durante a visita do Papa João Paulo II a Campo Grande, o templo foi elevado à condição de catedral metropolitana. Já em 1994, foi consagrado oficialmente pelo arcebispo Dom Vitório Pavanello. Desde então, a catedral passou a se chamar Paróquia Santo Antônio – Catedral Metropolitana Nossa Senhora da Abadia, unindo a tradição local à herança mineira trazida por outros pioneiros, como Elizeu Ramos.
Santo milagroso - Além de padroeiro de Campo Grande, Santo Antônio é conhecido mundialmente por sua intercessão poderosa e pelos inúmeros milagres atribuídos a ele. “Santo Antônio tem milagres que aos nossos olhos transcendem a lógica. Um dos mais conhecidos é o da criança que morreu afogada e foi ressuscitada após a mãe pedir ajuda ao santo. Em retribuição, ela prometeu doar, enquanto vivesse, o peso do filho em pães aos pobres. Esse gesto de gratidão se espalhou pela igreja”, explica o padre Wagner.
É dessa tradição que nasce a distribuição do Pão de Santo Antônio. Até hoje, toda terça-feira, dia em que o milagre teria acontecido, a catedral abençoa e distribui pães aos fiéis. “É um gesto simples, mas profundo. A bênção do pão nos lembra que Santo Antônio sempre cuidou dos pobres e necessitados. Esse cuidado é parte da identidade da igreja”, reforça o pároco.
Na virada para os anos 2000, surgiu também a tradição do Bolo de Santo Antônio, recheado com medalhinhas e pequenas alianças escondidas. “No início, era apenas o bolo. Depois, pensamos em colocar símbolos vocacionais: medalhinhas para quem sente o chamado à vida religiosa, e alianças para aqueles que desejam constituir família. Afinal, Santo Antônio é também o grande protetor dos lares e dos casamentos”, destaca o padre.
Casamenteiro - A fama de “santo casamenteiro” tem raízes históricas. Na Europa do século XIII, dotes eram exigidos para que mulheres pudessem se casar, e muitas famílias pobres não conseguiam cumprir essa exigência. Santo Antônio, sensibilizado com a situação, passou a doar anonimamente os dotes necessários, viabilizando matrimônios. “Era uma atitude revolucionária para o seu tempo. A generosidade dele ajudou a consolidar esse título de protetor das famílias. Nós, brasileiros, demos a isso um tempero ainda mais popular, e transformamos essa devoção em algo muito presente no cotidiano das pessoas”, comenta padre Wagner.
Milagres e histórias que cercam a vida do santo encantam e inspiram os fiéis até hoje. Como o episódio em que ele pregou aos peixes após ser ignorado por uma cidade dominada por hereges. “Os peixes saíram à tona para ouvir. Ao verem isso, as pessoas pensaram: ‘se até os peixes o escutam, quem somos nós para não ouvir?’”, relata o sacerdote.
Outro milagre emblemático é o da mula, que se ajoelhou diante da Eucaristia. Um cético desafiou Santo Antônio dizendo que só acreditaria na presença de Jesus na hóstia consagrada se sua mula faminta ignorasse o alimento e se prostrasse diante do Santíssimo. E foi exatamente o que aconteceu. “Se até um animal é capaz de reconhecer a presença de Deus, que desculpa nos resta?”, questiona o padre.
Com mais paróquias dedicadas a ele do que qualquer outro santo no mundo, Santo Antônio é exemplo de fé viva. Em Campo Grande, sua presença vai além dos altares: está nas ruas, nos nomes de bairros, nas famílias e no coração de milhares de fiéis.
“Temos aqui na paróquia muitas histórias de casais que se formaram pela devoção a ele, famílias inteiras que nasceram com esse propósito de fé. Uma mãe grávida do terceiro filho me disse recentemente: ‘enquanto vida eu tiver, quero continuar gerando para Deus uma família que faça valer a pena a fé que nós temos’. Esse é o legado de Santo Antônio em Campo Grande. Ele continua intercedendo por nós, protegendo e guiando esta cidade que nasceu de uma promessa e de uma devoção sincera”, conclui o padre Wagner.
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